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Um ano após o primeiro fechamento das escolas no Brasil, o setor da educação ainda vive momentos de incertezas, mas também de impermanências. Há diferença entre esses dois termos? Qual a importância disso para as decisões futuras dos gestores escolares?

Como explica Alexandre Le Voci Sayad, jornalista, escritor e educador, as incertezas, assim como as angústias e as dificuldades, são comuns em situações de crises. “Incerteza é isso que a gente vive hoje, de não saber o que pode acontecer dali a duas semanas, qual é o próximo decreto, qual é a próxima decisão pública, o que vai acontecer com as vacinas e etc”.

Já a impermanência, ainda segundo ele, está relacionada com a qualidade daquilo que não é tão fácil de se livrar. “A questão da cultura permanecer por pouco tempo vigente, dos movimentos serem mais curtos, das gerações serem mais curtas é uma característica do nosso tempo”, exemplifica. 

Nesse momento, por mais difícil que seja, o gestor escolar precisa se preparar para a incerteza; para impermanência ele já tem que estar pronto. Fazendo uma referência ao sociólogo Edgar Morin, Alexandre ressalta que ter essa noção é determinante para que a escola possa cumprir o seu papel de ajudar a enfrentar os problemas da vida.

“A transformação na escola é cultural esse ano”

O olhar dos gestores precisa ser amplo e complexo, sempre em atenção às circunstâncias da pandemia e do contexto da pós-modernidade (movimento, gestão ágil, digital, etc.). E nesse momento em que se fala muito sobre a transformação digital na educação, Alexandre afirma que tal processo merece ser visto também como como cultural: 

“Eu acho que a transformação na escola é cultural e ela passa pelo digital […] O papel pedagógico da escola de preservar conhecimento é um papel educativo mesmo, pedagógico, mas na gestão a gente tem que estar conectado com a agilidade desse tempo e a tecnologia”. 

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Relacionada a essa hiperconectividade, o Lifelong Learning é trazido como uma tendência contemporânea. Em uma tradução livre, esse termo significa “aprendizagem ao longo da vida”, o que extrapola o uso das mídias digitais e esbarra no entendimento da escola como um agente que também contribui no aprendizado do aluno egresso e até mesmo dos seus pais.

Essa contemporaneidade, abordada por Alexandre, também traz uma série de novos conceitos, dos quais muitos já são conhecidos pelas escolas brasileiras:

  • Alunos no centro da aprendizagem;
  • Aprender a fazer (espaços maker);
  • Aprender a aprender (curadoria);
  • Exames de admissão;
  • Flexibilidade do currículo;
  • Habilidades socioemocionais;
  • Plano de vida.

Algumas delas até se misturam, como a curadoria e as habilidades socioemocionais. “A curadoria é um estojo, um conjunto de habilidades socioemocionais, ela não é uma coisa, uma habilidade […]  Então, você tem, por exemplo, habilidade de pesquisa, pesquisa digital, essa é uma habilidade importante para a curadoria, se você não pesquisa e não chega na sua amostragem, você não tem como curar, como selecionar”, explica o educador.

Por outro lado, há tendências pouco exploradas, como é o caso dos currículos digitais. Os Recursos Educacionais Abertos (REA) – tudo o que é gratuito na internet e livres de direitos autorais -, em especial, na perspectiva de Alexandre poderiam ser melhor aproveitados se as escolas também estimulassem o seu uso em casa pelas famílias.

“REA é uma maneira de você expandir a cabeça da pessoa. Muitas vezes o professor pode ter uma formação específica para recursos educacionais abertos, que é muito importante, mas os pais têm os recursos educacionais abertos em casa e muitas vezes eles podem usar para fugir do trivial”, pontua.

Sua escola é uma bússola, um barco ou um boia? 

Nesses tempos de incertezas, a escola tem três papéis significantes: bússola, barco ou boia. Antes de explicar a definição de cada um deles, trazidas por Alexandre, é importante destacar que devem ser vistas como complementares.

O barco – “Barco é o currículo da escola propriamente, quer dizer, o aluno embarca quando ele começa no ano e esse currículo é o que vai levá-lo a navegar no mundo da informação […]  Vamos dizer que a escola como barco é uma escola que a gente está acostumado a ter hoje”.

A bússola – “A bússola tem haver com Lifelong Learning e tem a ver com o mundo de informações do qual estamos submersos. A escola tem um papel, e aí é repensar produto, repensar objetivo, dimensioná-la a ser a nossa bússola nesse barco. A escola pode orientar alunos e pais a estudarem fora do universo dela, indicando esse norte”.

A boia – “Como boia, eu acho que é uma questão de que as pessoas estão mais atentas, mas não estavam até então: é o acolhimento. A escola é um espaço de acolhimento emocional para os alunos, em tempos de incerteza que são os tempos passageiros, mas que fazem parte da história da educação”.

Assista à palestra completa:
Perspectivas e tendências para a educação em tempos de incertezas