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Estar na escola, no curso ou na faculdade significa que o aluno e seu corpo estão presentes nesses lugares e interagem com os colegas para estudarem juntos, trocarem experiências, dialogarem com o professor, estabelecerem uma relação de troca que o ensino presencial proporciona. Mas a pandemia “trouxe o ensino literalmente para dentro de casa. Não há mais o pátio, a escada e a correria”. Tudo isso mudou. Agora, o ensino precisa ser online para evitar a contaminação pelo novo coronavírus. Como fica a relação professor-aluno no ensino não presencial? Esse tema é discutido pelas pesquisadoras Cristiane Carneiro e Clarice Costa Beber Scherer em um artigo publicado na revista Estilos da Clínica.

O texto propõe um estudo em relação à “participação do corpo no ensino não presencial”, tendo como pressuposto que a relação professor-aluno é baseada no estímulo, no incentivo e na participação do movimento corporal. As autoras investigam “as marcas desse encontro/desencontro entre corpos” no questionamento das “possíveis ocorrências da não presença física no ensino remoto”.

Apesar de algumas crianças e adolescentes reclamarem que a escola ou a instituição é uma “chatice” ou “uma prisão”, hoje, com o distanciamento forçado que a pandemia impôs, os alunos sentem saudades dos colegas e “da instituição escola e seus espaços”. Se a escola é um espaço determinado por regras e regulamentos, ela é, também, espaço de “rompimento com o estabelecido e de trocas afetivas que o transformam em um espaço vivo. A escola torna-se um lugar de corpos pulsantes”.

A questão atual é de como estabelecer virtualmente a mesma relação com os alunos que se movimentam e circulam entre aprendizados e afetos no “palco vivo” da escola, em que o “educador constrói suas particulares formas de leituras do outro-aluno para modular sua relação com ele”. A imagem, privilegiada pela pandemia, fez nascer uma nova forma de comunicação, pois a narrativa, para ser entendida, não conta mais com sequências do tempo linear – presente, passado e futuro, mas o sentido é captado pela mistura dos três tempos, “a partir de flashes de imagens pouco relacionados entre si”. Entende-se o sentido da narrativa no instante em que a imagem aparece na tela.

O ensino online acaba por achatar a relação aluno e professor, pois este é pressionado e atado por obrigações quantitativas de aulas sem motivação diante do “aluno sem corpo”, ou seja, “aqueles que não aparecem, nem através da imagem, nem da voz”. Essa afirmação nos alerta para a dimensão da relação entre educador e o aluno e seu corpo no ensino presencial, pois, para o professor fazer uma “leitura” desse aluno é preciso a presença, o “aluno-corpo” e, para isso, o próprio educador precisa buscar seu “eu” capaz de lidar com o outro que, no caso é o aluno, este que assim passa a não ser mais um “aluno-corpo-estranho”.

As autoras advertem para a relevância, no processo de aprendizagem, da troca de experiências que envolvem as manifestações do corpo em sociedade. “Sem o ritmo, o movimento, e a expressividade do corpo do outro, a leitura do espaço entre educador e aluno – mais a linguagem” teria de ser realizada de outra maneira. A escola não é mais uma vivência concreta, “diante de corpos reduzidos e achatados”, mas o educador pode criar um modo de aproximação com seus alunos, de forma a preencher um pouco o vazio do aluno que se sente só, isolado e desestimulado diante de uma nova realidade educacional.

Artigo: CARNEIRO, C.; SCHERER, L. C. B. Corpos estranhos ou não-corpos: reflexões sobre a participação do corpo no ensino não presencial. Estilos da Clínica, São Paulo, v. 26, n. 1, p. 4-16, 2021. ISSN: 1981-1624. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.1981-1624.v26i1p4-16. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/178985. Acesso em: 02 jun. 2021.

(*Por Margareth Arthur/Revistas da USP)