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Abordar em sala de aula sobre a importância dos espaços urbanos é uma oportunidade de impulsionar os estudantes a refletirem sobre os problemas vivenciados nas cidades, além de incentivá-los a pensarem e encontrarem possíveis soluções para os desafios existentes.

Para Áquila Nogueira, gestor de projetos educacionais da BEĨ Educação, “o planejamento urbano é um tema, como tantos outros, que demanda a inter-relação de saberes e que acaba sendo pouco e mal trabalhado na escola”.

Com o intuito de se aprofundar neste assunto e possibilitar novas inspirações para a gestão escolar, o Escolas Exponenciais conversou com o profissional. Confira a entrevista:

 

Escolas Exponenciais: De modo geral, qual a importância na vida dos alunos de estudar os espaços urbanos ? Por que é importante fomentar a educação cidadã? 

Áquila Nogueira: A maioria das pessoas, e aqui se inserem nossos alunos e suas famílias, vivem em cidades, sendo 85% de urbanização no Brasil pelos números mais recentes. Entender a dinâmica de desenvolvimento e funcionamento das cidades possibilita lidar melhor com os problemas e desafios pelos quais passamos diariamente, além de abrir caminho para pensar, imaginar e sonhar soluções e novas possibilidades de viver e interagir com a cidade.

A minha geração aprendeu muito pouco sobre a cidade em que vive na escola, talvez em iniciativas isoladas de professores específicos. Se pouco conhecemos, como podemos intervir e modificar os problemas que vivemos? Assim, quando temos uma eleição, diferentes candidatos apresentam promessas vazias e muitas vezes completamente fora de seu escopo, mas as pessoas não sabem de nada disso, e assim não têm como julgar e fazer escolhas conscientes. 

 

EX: Como a escola pode trabalhar a importância do planejamento urbano? Além desse tema, que outros temas relacionados ao espaço urbano podem ser trabalhados na sala de aula? 

Áquila Nogueira: O planejamento urbano é um tema, como tantos outros, que demanda a inter-relação de saberes e que acaba sendo pouco e mal trabalhado na escola. Podemos tomar o exemplo do desastre em São Sebastião.

Qualquer um que teve algumas aulas de Geografia e Ciências que abordam o tema sabe que o desmatamento leva à erosão do solo e isso pode gerar desastres. Porém, esse saber descontextualizado não ajuda a explicar como esses desastres seguem acontecendo com regularidade.

É importante entender a especulação imobiliária, os interesses envolvidos e a construção de políticas públicas para saber não só o que pode ser feito, mas o que de fato acontece e as razões por trás das escolhas, até para poder participar no processo decisório e cobrar as instâncias adequadas. Aqui falamos bastante de planejamento, mas também de saneamento, moradia e desenvolvimento sustentável. É importante, ainda, discutir questões como a mobilidade, a economia e a cultura. 

 

EX: A partir de quais componentes curriculares é possível explicar para os alunos a relação entre espaço público e democracia? 

Áquila Nogueira: A associação com as Ciências Humanas é bastante clara, afinal a Geografia fala das relações espaciais, bastante presentes no estudo de cidades, enquanto a História discute o desenvolvimento das cidades e da relação entre as pessoas, além da Sociologia que se debruça sobre essas relações interpessoais.

 Além disso, as Linguagens são centrais na compreensão dos discursos e mesmo da documentação que pauta essas relações, além das Ciências da Natureza que ganham cada vez mais relevância na compreensão das relações humanas com o meio em que vivemos, afinal, a percepção de que os recursos naturais são cada vez mais finitos pauta as decisões que tomamos.

Isso reforça a importância de conectar saberes para poder compreender sua posição e possibilidades no espaço público, para poder ter consciência e responsabilidade, com um papel ativo na construção de uma sociedade mais democrática e participativa. 

 

EX: De que forma a escola pode relacionar o estudo da cidade com a realidade vivida pelos estudantes? 

Áquila Nogueira: A associação do que aprendem na escola com sua realidade é mais simples quando falamos de cidades, afinal os estudantes enxergam as questões discutidas no seu dia a dia. Pode ser difícil entender a dinâmica de poder na relação entre as Coreias do Norte e do Sul, mas o excesso de engarrafamentos é algo por que os estudantes passam e percebem. Ademais, acredito que uma palavra-chave aqui seja “desnaturalização”.

Somos acostumados, ao longo da vida, a entender que as coisas são como são porque sim. Há pessoas em situação de rua, enchentes acontecem, pagamos impostos e os preços sobem, porque sempre foi assim e sempre será.

Quando olhamos ao redor e prestamos atenção, podemos entender o porquê de haver tanto lixo espalhado na rua, e podemos pensar em soluções, que podem ou não funcionar, mas que vão certamente nos levar a aprender mais. Assim, estimulando a curiosidade e a responsabilidade nos estudantes, uma mera volta no quarteirão da escola pode levar a descobertas que podem mudar sua relação com o lugar onde vivem e, a partir daí, a caminhos que podem impactar todo o curso de suas vidas. 

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EX: Existe diferença na abordagem do tema dependendo do contexto no qual os estudantes estão situados (alunos de diferentes classes sociais, por exemplo)? Como contemplar as diferentes vivências em uma turma diversa? 

Áquila Nogueira: Creio que diversas vivências possam levar a diversos olhares sobre a cidade e assim a diversas possibilidades de intervenção e mudança. Estudantes diferentes podem conhecer as realidades dos colegas e assim ter contato com problemas e possibilidades diversos, ampliando seu campo de experiência e conhecimento, aprendendo com colegas muito mais do que poderiam aprender com professores ou livros.

Por outro lado, quando estimulamos os jovens a olhar ao redor, compreender a realidade e buscar soluções, estimulamos o desenvolvimento de atitudes positivas e cooperativas, o que valoriza o respeito, a diversidade e a pluralidade de ideias. 

 

EX: Nessa formação cidadã, o que compete à gestão escolar e o que compete aos professores? 

Áquila Nogueira: O professor aparece como uma figura problematizadora e incentivadora. Ele pergunta, mas também ouve e estimula o debate e a troca de ideias. A ideia é que ele seja um facilitador do processo dos estudantes. Por outro lado, é difícil conhecer a cidade sentado em uma sala de aula.

É importante sair da escola, realizar visitas técnicas e ter recursos que possibilitem diversas interações com a cidade, como ferramentas tecnológicas e mesmo materiais mais físicos, como maquetes. E um professor sozinho, em geral, não consegue trazer todas essas possibilidades sem o apoio da gestão escolar, que precisa entender a ideia e facilitar o processo para professores e estudantes. 

 

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