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Estudo recente da OPEE Educação revela que para 67% dos educadores brasileiros, as consequências da tecnologia no progresso de crianças e adolescentes é desfavorável, contra 33% que acreditam ser favorável.

A pesquisa, realizada em setembro deste ano, teve como objetivo diagnosticar o cenário pedagógico e escolar no Brasil, abordando o uso da tecnologia na educação. Realizado em escolas públicas e privadas, o estudo fornece insights valiosos sobre como os educadores percebem a relação entre tecnologia e aprendizado.

Uso excessivo de telas sem acompanhamento familiar

A pesquisa, que contou com 1.746 respondentes, sendo mais de 50% professores, abrangeu todas as regiões do país e abordou a percepção dos educadores sobre o impacto da tecnologia no desenvolvimento das crianças e adolescentes.

Um dado alarmante revelado pela pesquisa é que 97,02% dos educadores acreditam que as crianças e jovens estão usando excessivamente as telas, muitas vezes sem a supervisão dos pais ou responsáveis. Essa realidade levanta preocupações sobre os efeitos do uso indiscriminado da tecnologia.

Outro dado interessante que a pesquisa evidencia é que 43,81% dos educadores afirmam que o tema da utilização de recursos como inteligência artificial por parte dos alunos é debatido com frequência, visto que é uma preocupação em relação à aprendizagem.

A tecnologia facilita muitos âmbitos da nossa vida, mas quando usada com precaução. “É essencial incentivarmos a presença autêntica, treinar o foco no presente, nas pessoas, reaprender a ‘desligar’ e repousar a mente”, afirma Leo Fraiman, psicoterapeuta, palestrante internacional, escritor e autor da metodologia OPEE.

Tecnologia na sala de aula

De acordo com o estudo, 32,07% dos educadores relatam utilizar a tecnologia regularmente em sala de aula. Dentre eles, 48,40% justificam seu uso devido à disponibilidade de recursos tecnológicos nas escolas. No entanto, em relação ao uso de celulares e tablets em sala de aula, 45,59% dos educadores permitem, desde que seja de forma consciente.

“A OPEE considera que há ganhos sim no uso da tecnologia, mas considerando o dado de que o Brasil tem sido um dos países cuja população fica mais tempo diante de telas por dia, precisamos urgentemente entender que se ‘em terra de cego quem tem olho é rei’, como diz o ditado, em tempos de tecnologia, quem tem humanidade se torna soberano sobre seu destino”, explica Silvana Pepe, diretora-geral da OPEE Educação.

Tecnologia com consciência

Conforme observado por Fraiman, as tecnologias podem, de fato, desempenhar um papel valioso no processo de aprendizagem, na medida em que complementam a interação oferecida pelos educadores.

Um exemplo disso é quando um professor explora a fundo um tópico específico e o enriquece com imagens, cenas ou animações, demonstrando um uso eficaz da tecnologia.

Além disso, a tecnologia pode ampliar o repertório dos alunos de várias maneiras. Hoje em dia é possível utilizar diversas ferramentas tecnológicas para visitar museus virtualmente, pesquisar dados e fatos, bem como interagir com pessoas que possuem línguas, costumes, crenças e estilos de vida diferentes.

“Através da tecnologia, podemos acessar opiniões de diversas fontes, enriquecendo assim a experiência de aprendizado”, destaca.

Fraiman ressalta, no entanto, que a tecnologia deve ser vista como um complemento às práticas pedagógicas, e não como um substituto para os professores.

Estudos indicam que países que investiram de forma massiva em tecnologia obtiveram resultados inferiores em comparação àqueles que investiram na formação de professores e no acesso a materiais impressos, como livros.

“Neste contexto, a promoção da leitura física, incentivando mães a lerem com seus filhos, demonstra ter resultados mais significativos do que a simples distribuição de tablets”, comenta.

Bullying e tecnologia

A pesquisa revela, de forma ampla, que os educadores consideram que os impactos da tecnologia no desenvolvimento do comportamento infantil e juvenil são mais negativos (67%) do que positivos (33%).

Dentre as grandes consequências desfavoráveis, estão a redução da interação e da convivência entre os pares (30,20%) e a dificuldade de concentração e foco (29,86%). Já os impactos positivos de destaque são a facilitação do aprendizado (44,68%) e o melhor rendimento escolar (22,70%).

O estudo destaca ainda que para 80,87% dos educadores, o bullying e o cyberbullying são práticas favorecidas pela tecnologia. Práticas violentas que vêm ganhando amplitude no país, como mostra o estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que apontou que um em cada dez estudantes sofre com o cyberbullying, marcado por ofensas praticadas pela internet.

Segundo o psicoterapeuta, o uso excessivo de dispositivos eletrônicos muitas vezes surge de uma falta de profundidade nas relações humanas, especialmente em lares marcados pelo abandono, isolamento, agressividade e autoritarismo. Nessas condições, há uma maior propensão para que as telas se tornem a principal ou até mesmo a única forma de interação entre as pessoas.

“É fundamental reconhecer que a autonomia não significa abandonar a criança e deixá-la fazer o que quiser. Em vez disso, exige que tenhamos a coragem de ser pais, adultos e educadores atentos, conscientes e envolvidos, encontrando o equilíbrio entre demonstrar afeto e estabelecer limites de forma apropriada”.

Psicoterapeuta comenta os prejuízos do uso em excesso das telas

Palestrante internacional, escritor e psicoterapeuta, Leo Fraiman afirma que existem, hoje, muitas evidências científicas que apontam que o uso excessivo e irresponsável das tecnologias gera prejuízos nas mais diversas áreas das nossas vidas.

Um exemplo citado por ele é o impacto negativo no sono de crianças, jovens e adultos que mantêm os dispositivos eletrônicos, como celulares, em seus quartos. “Muitas vezes, o celular parece ‘ouvir’ nossas conversas, uma vez que após mencionarmos algo, anúncios relacionados podem aparecer durante nossa navegação nas redes sociais ou na internet”, comenta.

Além disso, afirma o especialista, a constante recepção de notificações, mensagens e atualizações cria um campo eletromagnético que interfere de forma prejudicial com o funcionamento do cérebro.

De acordo com o psicoterapeuta, a vibração do celular ou o recebimento de mensagens durante a noite também impacta negativamente na qualidade do sono, afetando a produção de melatonina. “A melatonina é essencial para a formação de memórias, aprendizado e consolidação do conhecimento durante o sono. Uma noite mal dormida resulta em um dia mal vivido”.

Outro efeito negativo decorrente do uso inadequado de dispositivos eletrônicos é observado quando, em situações cotidianas, as pessoas, em vez de interagirem umas com as outras, passam a tratar os outros como meros avatares. Isso compromete a socialização, a inteligência emocional e a capacidade de se relacionar de forma significativa.

Como resultado, ocorre isolamento e relações superficiais, o que, ironicamente, contribui para um aumento da infelicidade. Estudos apontam que a qualidade das relações interpessoais é um fator importante para a felicidade.

“O mundo atual está hiperconectado, mas paradoxalmente, as pessoas se sentem cada vez mais isoladas. As bolhas de informação, nas quais as pessoas são expostas principalmente a perspectivas semelhantes às suas, criam um cenário propício para a falta de empatia, a dificuldade de lidar com a diversidade e até mesmo a ameaça à democracia”, enfatiza.

Para Fraiman, é urgente que escolas, famílias, governos, empresas e a sociedade como um todo tomem medidas para promover o uso mais consciente, responsável e saudável da tecnologia.

“A conscientização sobre os impactos negativos do uso excessivo dos dispositivos eletrônicos é fundamental para preservar a humanidade, a qualidade das relações e a integridade da sociedade como um todo”.

A pesquisa

O Estudo OPEE 2023 com educadores brasileiros: educando na era digital foi conduzido com profissionais da educação com mais de 24 anos (com prevalência da faixa entre 35 e 44 anos – 35,97%) e das cinco regiões do país (com o estado de São Paulo representando a maior fatia – 34,48%).

O público feminino representa 86,54% dos respondentes da pesquisa e os educadores de escolas privadas são maioria, com 78,58%. A maioria dos educadores, representando 38,60%, está na profissão há mais de 21 anos. Já em relação aos cargos ocupados, 29,32% são professores especialistas, 28,18% são professores polivalentes e 16,61% coordenadores.

As escolas com um número de alunos entre 201 e 500 se destacam, representando 36,08%, e o ensino fundamental nos anos iniciais é a grande área de atuação entre os educadores, equivalendo a 56,19%. No que diz respeito à metodologia OPEE, 47,65% dos educadores respondentes atuam com ela.

Foto: Imagem de Freepik.

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