Eleição: como abordar o tema de maneira democrática nas escolas?
A polarização política no país invadiu as famílias e os círculos de amizades dos adultos. E as crianças, que são verdadeiras esponjas, acabam absorvendo todo o clima de tensão, que passou a ser constante nos últimos anos. Diante de um cenário tão desafiador, muitos diretores estão inseguros em abordar a eleição de maneira democrática nas escolas.
Afinal, e se o clima esquentar entre os estudantes? E se o que era para ser uma discussão reflexiva se transformar em acusações e xingamentos? Apesar de o receio ser bastante compreensível, levar o assunto para o ambiente escolar é fundamental.
“Trabalhar eleição é trabalhar democracia e cidadania”, afirma Alexandre Sayad, jornalista, educador e diretor da consultoria ZeitGeist.
Este é um assunto que será abordado pelo profissional na masterclass “Eleições na escola”, uma iniciativa do Escolas Exponenciais. A conversa será realizada no dia 28 de setembro, às 14h30, e é exclusiva para as escolas associadas.
Em uma entrevista ao EX, Sayad deu algumas orientações sobre como trabalhar a eleição, abordar a democracia e evitar o fake news em sala de aula. Confira.
Escolas Exponenciais: Primeiramente, qual a importância de trabalhar o tema eleição em sala de aula?
Alexandre Sayad: Trabalhar eleição é trabalhar democracia e cidadania. Historicamente, o primeiro lugar em que a criança, fora da família, vai entrar em contato com um ambiente democrático, é a escola.
A família é um ambiente muito protegido. O primeiro lugar público, onde a criança, o pré-adolescente e o adolescente vão exercer a negociação de direitos, de espaço, dividir questões, cumprir leis e ordens, questões institucionais e vão conviver com as diferenças, é a escola.
Desde o nascimento da escola enquanto instituição, se pensa a escola como um locus democrático, onde você tem que exercer a cidadania lá dentro. E, também, exercer e entender o que é democracia.
Numa régua, você tem o extremo, que é chamado de escola democrática, uma característica de escola em que os alunos decidem o próprio caminho que a insntituição toma, por meio de assembleias, por exemplo.
E você tem escolas mais rígidas, que muitas vezes são chamadas de tradicionalistas. Eu acredito que tem um meio termo muito importante para a escola abrir espaço e o estudante exercer a democracia.
EX: Em tempos de polarização, quais os principais cuidados que os professores devem ter ao falar sobre eleição?
Alexandre Sayad: Não reproduzir a polarização. Dentro da comunicação, entendemos que a polarização é derivada de um simplismo na abordagem das questões, tanto pela mídia quanto por quem consome a mídia, como os eleitores. Ela tende a ser polarizada porque, muitas vezes, não se tem informação dos dois lados do debate.
Muitas vezes se esquece a memória histórica e se chega em uma situação de polarização porque não se tem uma memória coletiva histórica. Então, em tempos de polarização, a escola – assim como a sociedade – tem que aprender a trabalhar com a complexidade, que é um conceito de um filósofo chamado Edgar Morin. A gente precisa explicar o que é complexo, não de uma maneira simples.
A escola tem o dever de explicar a complexidade no seu todo. Quando estamos falando de eleição, a polarização oculta a complexidade. Precisamos entender o que está por trás da polarização. O tema, ao meu ver, tem que ser transversal neste sentido. Tem que envolver a escola inteira, o histórico do Brasil, o histórico dos partidos, a complexidade que há por trás das propostas, etc.
EX: Como trabalhar o assunto de maneira democrática?
Alexandre Sayad: Trabalhar a eleição de maneira democrática é deixar a democracia acontecer. Democracia não é um assunto para a aula de história. Democracia é um exercício, requer habilidades e competências, que o aluno precisa desenvolver e não aprende apenas em uma aula expositiva.
Um caminho é dar algumas decisões que possam ser compartilhadas com os alunos, onde eles possam opinar e ter sua expressão em certas decisões da escola. Isso faz parte do exercício democrático e faz parte entender a polarização quando você está no meio de um debate, qualquer que seja e por menor que seja, como onde colocar um bebedouro de água, por exemplo.
Trabalhar a democracia dentro da escola é exercê-la dentro da escola. Como colocar todos os alunos para exercer a democracia? Tem algumas maneiras. O tradicional grêmio estudantil, no ensino médio, é uma das formas. É onde os alunos têm as lideranças, as eleições, tomam decisões e realizam calendário cultural dentro das escolas.
Uma outra maneira que defendo muito e pratico muito é por meio da comunicação. Os alunos precisam ter expressão e voz ativa das ideias dentro da escola. Para isso, eles podem produzir a própria mídia, seja para escola, seja para a comunidade.
Outras possibilidades são a rádio escolar, o podcast, um jornal digital ou a revista da escola. É neste debate, que quando a voz do aluno passa a circular, que você tem a oportunidade de sair da polarização e exercer a democracia de uma forma interessante e plena.
EX: Trazer a eleição em sala de aula também é uma maneira de combater a fake news? O quanto é importante que os alunos, antes mesmo de votarem, tenham consciência da necessidade de checar as informações?
Alexandre Sayad: Quando você trabalha a comunicação livre, a expressão dos alunos, você esbarra em uma série de questões éticas. Produzindo notícias e artigos de opinião, você passa a entender melhor como a mídia funciona. É produzindo que você vai descobrir a diferença entre uma notícia e um artigo de opinião.
Agora, o que posso considerar uma notícia fake? Quais as nuances da fake news. A checagem, que é um exercício fundamental da escola, começa também na produção de mídia. A disciplina de português por exemplo, pode adotar uma oficina de checagem e levar um jornalista para falar sobre o que é checagem.
O que não pode acontecer é uma escola muito rigorosa com os alunos, que não dá espaço para expressão, queira ensinar democracia na aula de história. Isso não funciona. Democracia é algo que tem que ser ensinado vivendo. E a escola é o ambiente mais imediato do contato com a política do dia a dia, com a democracia e com a cidadania.
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