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Um estudo que mapeia e analisa currículos inovadores de cursos de licenciatura – aqueles voltados para a formação de professores – acaba de virar livro. Trata-se de Uma Cartografia na Formação de Professores Para a Educação Básica: Práticas e Soluções Inovadoras em Propostas Curriculares, de Bernardete Gatti, Luisa Veras de Sandes Guimarães e Daniel Fils Puig. A obra está disponível gratuitamente no Portal de Livros Abertos da USP (neste link).

 

Publicação da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica da USP, o livro é fruto de pesquisas de pós-doutorado de Luisa e Puig, coordenadas por Bernardete, que é conselheira da Câmara de Educação Superior e integrante do comitê consultivo da cátedra. Na obra, os autores investigam cursos de dez universidades públicas das regiões Nordeste, Sudeste e Sul do Brasil, nos quais ocorrem a interdisciplinaridade na formação de seus estudantes e a articulação com as escolas de ensino básico do entorno.

Conforme explicam na introdução do volume, os pesquisadores buscaram identificar iniciativas com dinâmicas curriculares diferenciadas, com o objetivo de compreender os caminhos e as soluções adotados pelas instituições analisadas. O foco se deteve nos casos que almejam alterar integralmente a estrutura dos currículos de uma ou mais de suas licenciaturas.

Foram observadas quatro instituições que oferecem um conjunto de licenciaturas centradas na interdisciplinaridade: Universidade Federal do ABC, Universidade Federal do Maranhão, Universidade Federal do Sul da Bahia e Universidade do Extremo-Sul Catarinense. Outras cinco, apesar de possuírem licenciaturas mais tradicionais, trazem também cursos considerados inovadores: Universidade de São Paulo (Licenciatura em Ciências da Natureza), Universidade de Brasília (Licenciatura em Educação do Campo), Universidade Federal de Minas Gerais (Formação Intercultural de Educadores Indígenas), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (Licenciatura Interdisciplinar em Artes) e Universidade Federal do Paraná (Licenciatura em Ciências). O livro estuda ainda a experiência do Complexo de Formação de Professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A partir da análise dos casos mapeados, os autores identificaram algumas práticas que distinguem essas licenciaturas dos modelos tradicionais. Destaca-se, em primeiro lugar, a consciência do projeto pedagógico institucional compartilhada por todo o corpo docente. Aliada a isso, aponta-se também uma forma mais coletiva do envolvimento dos docentes com as atividades curriculares, pensadas de maneira mais integrada e menos separada por disciplinas. É o que acontece, por exemplo, na Universidade Federal do ABC, onde não há pré-requisitos fixos para as disciplinas, que são compartilhadas por todos os cursos.

Outra inovação apontada é o destaque para o papel do professor universitário como educador e não apenas como pesquisador. Com uma atuação próxima aos licenciandos, os docentes acompanham os estudantes nas atividades dentro e fora da universidade. Há uma tentativa de valorizar a atividade de ensino dentro da própria instituição, muitas vezes considerada secundária ou menor diante das atividades de pesquisa.

Em algumas das instituições analisadas, a organização dos tempos e dos espaços educativos procura ser flexível e promover a integração com redes de ensino e escolas. Em certos casos, busca-se mesmo mudar a relação entre educação básica e educação superior, com o incentivo a uma maior “horizontalidade” entre os licenciandos e os professores das rede de ensino com os quais a universidade se relaciona, tendo em vista a cooperação. Nesse sentido, há o desenvolvimento de projetos de estágio planejados com as redes escolares.

Contexto sociocultural

Há também, conforme atestam os pesquisadores, atenção para o contexto sociocultural e seus impactos na aprendizagem, tanto dos licenciandos quanto dos estudantes da educação básica. Na Universidade Federal do Sul da Bahia, em 2014, por exemplo, 14 mestres de saberes tradicionais da região (pajés, mestres de capoeira, pais e mães de santo, entre outros) estiveram em sala de aula com os estudantes. No mesmo período, os cursos de licenciatura também produziram uma cartografia dos saberes tradicionais e populares do sul da Bahia.

Essa atenção permite o planejamento e o uso de recursos variados para formar os licenciandos, como parcerias com outras instituições, estímulo a núcleos de estudo com atividades integradas e subsídios curriculares, destacam os autores de Uma Cartografia na Formação de Professores para a Educação Básica. Também favorece a instalação de comunidades de aprendizagens para atualização de conhecimentos e práticas em diferentes espaços.

Por fim, o próprio currículo escolar da educação básica procura ser pensado em perspectiva interdisciplinar, superando a divisão tradicional por matérias como História, Biologia e Matemática. Um exemplo dessa postura pode ser visto na Licenciatura em Ciências da Natureza da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP. Voltada sobretudo para o ensino fundamental, essa graduação reúne professores de variadas áreas da Universidade com a perspectiva de construir uma formação diferenciada para a docência em ciências.

“Como um problema que se anuncia hoje como social, a formação inicial de professores, nas licenciaturas, está demandando olhares e realizações que possibilitem dar identidade a essa formação, construindo-se maior integração nas, e entre, as licenciaturas e seu corpo docente, em perspectivas colaborativas, assumindo as práticas educacionais como práticas socioculturais, com base em uma ética social que destaque o valor dessa formação e da profissionalidade a ela associada”, escrevem os autores.

Uma Cartografia na Formação de Professores para a Educação Básica: Práticas e Soluções Inovadoras em Propostas Curriculares, de Bernardete Gatti, Luisa Veras de Sandes Guimarães e Daniel Fils Puig, Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica da USP, 161 páginas (disponível gratuitamente no Portal de Livros Abertos da USP. Clique aqui). 

*Por / Jornal da USP