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O Brasil concorre neste ano no Global Teacher Prize, considerado o “Nobel da Educação”. O trabalho do professor Helder Guastti, de 37 anos, focado em leitura e afeto, na cidade de João Neiva, interior do Espírito Santo, foi reconhecido pela premiação, que anualmente homenageia docentes que impactam suas comunidades no mundo todo.

Ele está na lista dos 50 finalistas do prêmio promovido pela Varkey Foundation, braço sem fins lucrativos da GEMS Education, uma companhia de gestão educação. Em nove edições, 12 professores brasileiros já foram selecionados.

Na Escola Municipal Pedro Nolasco, Guastti é conhecido por seus trabalhos com mediação de leitura, produção de textos e rodas de conversa entre os alunos do 5º ano do ensino fundamental. “Meu ponto central na vida é a afetividade, na relação entre professor e aluno, e a literatura. Embaso todo meu trabalho nisso, nas possibilidades que a literatura de qualidade nos permite para criar vínculos positivos.”

Chamado “Como diz o Outro”, o projeto avaliado pelo Global Teacher Prize foi realizado pelo professor em 2023. A atividade previa resgatar contos populares por meio de leituras, pesquisas e discussões, e ganhou novos contornos durante sua execução sugeridos pelos alunos.

“Incluímos ditados, provérbios, trava-línguas: tudo isso sempre com o movimento de leitura e discussão em sala de aula, pesquisa com avós, mães e familiares em casa. Também fizemos movimentos nas ruas com os munícipes. Foi muito lindo porque eu só estava ali acompanhando. A mediação de todos os processos foi feita pelas crianças”, descreve o educador.

O papel das IAs

A iniciativa resultou em um livro com ilustrações geradas a partir de inteligência artificial. Novamente, a ideia surgiu das crianças. Guastti conta que um dos seus alunos chegou na escola revoltado depois de ver uma notícia de que estudantes haviam feito montagens pornográficas com as meninas da sala, utilizando inteligência artificial.

Durante a discussão sobre mau uso dessas ferramentas, eles tiveram a ideia de aproveitá-la, de forma positiva, no projeto. “E aí elas lançaram para mim: ‘por que não tentamos usar essas ferramentas na elaboração das nossas ilustrações para o nosso livro?’ Eu pirei e foi uma outra grande virada de chave do projeto.”

Além de professor entusiasmado e comprometido, Guastti transformou sua paixão pela literatura em um projeto social realizado em sua própria casa desde 2017. É uma biblioteca comunitária chamada Confabulando, que faz empréstimos de livros e promove ações de incentivo à leitura, como contação de histórias. O acervo conta com 1,8 mil itens, incluindo livros, mangás e revistas em quadrinhos.

“Sempre tive vontade de ter uma biblioteca própria, mas éramos muito carentes, não tinha condições. Não que hoje tenha muitas condições sendo professor, mas consigo manejar minhas conquistas. Fui frequentador assíduo da biblioteca pública municipal de João Neiva. Cresci, decidi ser professor, montei meu próprio acervo. E resolvi abrir oficialmente as portas de casa com esse espaço de leitura”, afirma.

Formado em Pedagogia, Guastti diz que a motivação para seguir na profissão vem da possibilidade de proporcionar mudanças na vida de seus alunos – enquanto transforma a própria. Quero ser o professor que nunca tive. Enquanto colaboro com o processo de aprendizagem das crianças, aprendo também. É uma via de mão dupla”, diz.

“Não dá só para viver na utopia de sonhar com um mundo melhor. É preciso concretizar ações que poderão efetivar esse mundo melhor, mais igualitário, e com equidade de oportunidades”, acrescenta ele.

Holofotes para garantir melhorias na educação

No ano passado, Guastti recebeu outro prêmio, o “Educador Nota 10″, no eixo Inovação e Tecnologia. Agora no Global Teacher Prize, ele não tem chances de ganhar o prêmio principal, que será anunciado entre os dias 11 e 13 de fevereiro, porque este será escolhido entre os 10 principais finalistas, e o brasileiro ficou no grupo dos ´top 50.´

Para Guastti, o mais importante desse tipo de reconhecimento não é ser grande vencedor, mas sim provar para as crianças “de que tudo é possível” e ao mesmo tempo inspirar colegas, “fortalecendo um trabalho muitas vezes solitário”.

“Tenho ânsia grande de tentar cativar colegas e inspirá-los a fazer a diferença de fato, organizar, planejar aulas, atividades, projetos, dinâmicas, seja o que for, considerando a criança como parte do processo”, diz.

Guastti relata que seu sonho é de que os holofotes se revertam em melhorias para a educação pública. “Todo mundo vai falar que o professor é muito importante, que forma todos os outros profissionais, com frases de efeito e discursos romantizados. Mas é preciso concretizar o que é falado na prática”, pondera.

“Receber o piso salarial, ter sala climatizada, recursos, instrumentos, livros didáticos. Minha expectativa é de que haja mudanças concretas, voar com as asas bem lá no alto, mas com os pezinhos lá no chão. Mas sei que a mudança vem a passos de tartaruga.”

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