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Para sair na frente da concorrência cada vez mais acirrada no mercado educacional, gestores escolares precisam entender as tendências do segmento e desenvolverem um posicionamento diferenciado.

O cenário é de grandes transformações e tomar decisões com base em dados do setor educacional, muito bem analisados, é fundamental. 

Para ajudar gestores escolares nessa missão, entrevistamos o especialista Luciano Sathler, PhD em Administração pela FEA-USP, Membro do Conselho Científico da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) e o primeiro pró-reitor de educação a distância do Brasil. O professor dá excelentes insights sobre o mercado de educação.

 

Escolas Exponenciais: Quais as principais tendências do mercado educacional brasileiro, com relação às escolas privadas da Educação Básica?

Luciano Sathler: O número total de matrículas na Educação Básica brasileira vem diminuindo nos últimos dez anos, pela queda da taxa de natalidade no país. E, ao mesmo tempo, a sociedade está exigindo mais qualidade na Educação Básica. Isso tem atraído investidores interessados em formar redes de escolas com a gestão compartilhada, na busca de ofertar modelos mais inovadores para estudantes e suas famílias. Isso vale tanto para os nichos premium quanto no segmento das mensalidades mais acessíveis. 

 

EX: 2020 foi um ano que acelerou o processo de mudança no ensino, introduzindo o ensino híbrido, levando o EaD à Educação Básica… Agora o ritmo de mudança diminui, se mantém, ou deve vir alguma nova grande mudança por aí?

Luciano Sathler: A pandemia é um gatilho de aceleração da cultura, especialmente ao obrigar a massificação – sem planejamento prévio – do teletrabalho, da educação a distância e do e-commerce. Estamos em meio a uma mudança paradigmática que reduz a presença dos traços que marcaram a Sociedade Industrial e amplia os impactos relacionados à Sociedade da Informação, com um conceito que ressalta um novo paradigma técnico-econômico que afeta a forma como as pessoas aprendem. 

A Sociedade da Informação é o conceito que ressalta um novo paradigma técnico-econômico que tem como base não mais a transformação proporcionada pela disseminação do acesso à energia elétrica ou da máquina a vapor, que marcaram a Sociedade Industrial, mas a centralidade da informação, cujo volume de produção, armazenamento, velocidade de disseminação e impactos na automação de processos produtivos propiciados pelos avanços tecnológicos afetam, inclusive, a forma como as pessoas aprendem.

EX:  E como as pessoas aprendem hoje?

Luciano Sathler: As pessoas aprendem de formas diferentes em tempos de convergência digital. A onipresença das telas no cotidiano muda a maneira com que o cérebro percebe e processa a informação. O ensino híbrido tem o potencial de aumentar a flexibilidade das escolas para atenderem alunos e professores. Pode reduzir as necessidades de infraestrutura, com o surgimento de dias alternados de aulas, oferece alternativas economicamente sustentáveis para desenvolver programas de recuperação e a reorganização do calendário escolar. A personalização das trilhas de aprendizagem a serem superadas pelos estudantes que apresentarem alguma dificuldade é mais viável com essa abordagem. Há vários tipos de ensino híbrido, que podem ser praticados em momentos alternados com a mesma turma, a depender dos objetivos de aprendizagem pretendidos e o perfil dos estudantes.

 

EX: Qual o grande marco da volta às aulas presenciais nas escolas? 

Luciano Sathler: O que se espera é que o retorno das aulas e demais atividades presenciais nas escolas seja marcado por uma transição profunda e acelerada na direção de uma pedagogia com mais diálogo, que privilegie a autonomia e o pensamento crítico dos estudantes. Trata-se de uma mudança de mentalidade, que extrapola a tecnologia e exige muito esforço de formação por parte de todos os envolvidos no processo educacional.  

 

EX: A tecnologia se mostra cada vez mais importante para o ensino, como lidar com isso em um país com uma brecha social tão grande como o Brasil? Mesmo em escolas privadas, existe uma grande diferença de acesso à tecnologia entre os alunos, que se tornou mais evidente com a pandemia.

Luciano Sathler: As Tecnologias de informação e Comunicação (TIC) representam hoje, grosso modo, o que o quadro negro e o giz significaram enquanto inovações no Século 19, ao permitirem então a exposição contínua de conteúdo a grupos maiores de estudantes e com custos menores do que os modelos anteriores, ainda artesanais. Prover conectividade a todas as escolas brasileiras e garantir uma boa formação para a sua adoção aos professores, às equipes técnico-administrativas, aos gestores, estudantes e seus familiares são questões estratégicas. Trata-se não só de possibilitar a inserção criativa e crítica das TIC para enriquecer as práticas didático-pedagógicas, mas empoderar essas pessoas para que se tornem também produtoras de tecnologias e não apenas usuárias. 

EX: Os professores tiveram que aprender muito para lidar com tanta transformação de uma hora para outra. Qual a importância de investir na capacitação desses profissionais daqui para frente? Ainda há muito o que aprender?

Luciano Sathler: Uma das lições que a pandemia deixará para a gestão escolar é que as mudanças no aprender impulsionadas pelas tecnologias exigem a valorização docente. A escola que se materializou dentro das casas, por meio do chamado ensino remoto – que, com raras exceções, nada mais é que educação a distância sem planejamento e estruturação adequada-, deixou explícita a complexidade dos processos educacionais sob a responsabilidade dos educadores, tanto professores como dos demais profissionais da educação. 

De acordo com uma ampla pesquisa realizada recentemente pela Fundação Varkey, em 2020 (fundação criada para aumentar a qualidade da educação para crianças menos privilegiadas em todo o mundo), há uma relação direta entre o status que a sociedade atribui à profissão do professor e os resultados de aprendizagem alcançados pelos alunos. O ranking revela que o Brasil é um dos países que menos valoriza a profissão docente no mundo, com pequenas diferenças de grau entre professores do ensino fundamental e médio. Essa é uma questão cultural de fundo que precisa ser trabalhada, pois não é possível conceber uma nova escola sem a participação democrática, o engajamento e a capacitação permanente dos educadores.

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EX: O que há de mais moderno pelo mundo, em termos de inovação em educação?  

Luciano Sathler: As promessas e ameaças trazidas pela automação de parte das relações de ensino-aprendizagem, com utilização de abordagens como aprendizagem da máquina (machine learning) e aprendizado profundo (deep learning). Quem souber alinhar as possibilidades dessas tecnologias facilitadoras com a realidade das escolas, com boas técnicas de storytelling, estará entre os próximos unicórnios que vão emergir nas edtechs

Assista ao evento completo:

Tendências do mercado educacional brasileiro