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Até os anos 2000, o Brasil tinha cerca de 16 mil escolas particulares; em termos de mercado, esse era um cenário ideal, pois a demanda superava a oferta. Agora possuímos mais de 40 mil escolas privadas enquanto vivenciamos uma redução da taxa de natalidade, o que faz com que a demanda seja menor que a oferta. 

De acordo com Ivan da Cunha, doutor em educação e diretor de consultoria e estratégias corporativas da Apoio Comunicação, hoje vivemos um momento de exaustão de mercado: 

“Vamos deixar bem claro, o mercado de educação continua sendo excelente. Só que agora nós saímos de um aspecto de educação onde a produtividade fazia diferença, para o momento onde a competitividade passou a ser a diferença”, explica.

Ainda segundo Ivan, essa mudança de cenário interferiu, por exemplo, na precificação das mensalidades escolares. Se antes ela era definida com base em uma conta simples: custo + mais lucro = preço da mensalidade, hoje é o mercado que determina esse preço. 

“Eu não consigo mais cobrar o que eu quero, colocar a mensalidade que eu quero, eu tenho que, dentro de uma possibilidade, de um nicho que eu sou trabalhando, saber que tem um preço estabelecido pelo mercado”, esclarece.

Enquanto a escola define sua política de preços, paralelamente, ela precisa desenvolver uma série de estratégias para agradar as famílias e se manter competitiva. Ou seja, posicionar-se em meio a esse cenário é de uma complexidade sem tamanho, o que exige cada vez mais estudos e pesquisas para auxiliar nas decisões mais estratégicas.

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Nem toda mudança é necessária

“Tem uma mantenedora que nós atendemos que estava desabafando semana passada, até brincou, falou assim “olha, eu só estou dando azar, porque eu invisto e a minha escola não se desenvolve. O que está acontecendo comigo?””.

Diante desse caso, mudar a estratégia seria a solução? Segundo Ivan, a mudança pode não ser necessariamente a melhor opção, mas sim o estabelecer processos dinâmicos que permitam transformações graduais e contínuas. Assim, o reposicionamento vai deixar de ser uma ação pontual para ser um processo contínuo.

“Transformação contínua não significa perder a sua essência, não significa abandonar a sua missão, significa uma adequação natural às expectativas, às demandas de uma sociedade que vibra em uma velocidade muito rápida”, reforça.

Tomando como exemplo a pandemia, que acelerou a transformação digital em diversos setores, no caso da educação, essa mudança aconteceu de forma compulsória. Muitas escolas sequer tiveram a oportunidade de aprender sobre aprendizagem mediada por tecnologia ou estudar as melhores práticas.

Na perspectiva do diretor da Apoio Comunicação, houve uma mudança, mas não uma transformação. E esse é um comportamento que já se repetia muito antes da pandemia, muitas instituições tomam decisões estratégicas baseadas apenas na concorrência, sem considerar outros indicadores, como o próprio mercado e os clientes. 

“Quantas escolas falavam assim “olha, eu preciso ter robótica, porque a mãe chega aqui e pergunta se eu tenho robótica” e eu perguntava quantas mães perguntam isso, “ah, um monte”, “um monte quantas?”, “ah, foram três””. Assim, decisões como essa, baseadas em um único indicador, podem ser perigosas e gerar custos desnecessários.

“Percebam que nós colocamos empecilhos ao estudo mais aprofundado que auxilia a escola a fazer as mudanças que precisa. Hoje a complexidade da educação necessita de estudos não que reduzam sua complexidade, mas que abracem a complexidade, a complexidade do mundo da educação não vai deixar de ser o que ela é hoje”, declara Ivan.

Por outro lado, decisões baseadas em estudos e pesquisas, pautadas na prática de benchmarking, por exemplo, podem sustentar as mudanças na escola de maneira mais significativa, levando a um reposicionamento gradual. 

Foco no cliente ou foco do cliente?

Assim como o mercado de educação mudou nos últimos 20 anos, o seu mercado consumidor também. Uma pesquisa realizada pelo Escolas Exponenciais antes da pandemia com pais da geração Y – nascidos entre as décadas de 80 e 90 – mostra quais são suas principais expectativas em relação às escolas dos seus filhos. 

Os cinco itens mais valorizados por eles são:

  • (82%) Cuidado e atenção pessoal com seu filho(a);
  • (80%) Excelente educação de valores morais e éticos;
  • (72%) Relacionamento próximo e participativo com pais e alunos;
  • (71%) Alto investimento na qualificação da equipe pedagógica;
  • (67%) Excelente material de ensino.

Hoje, mais do nunca, atender às expectativas dos clientes tem um impacto muito positivo no negócio, pois um cliente satisfeito é um cliente leal.“Durante muito tempo falavam que nós precisávamos ter foco no cliente, não é isso? Não, agora nós precisamos aprender a ter o foco do cliente, será que eu estou me colocando no lugar dele?”, questiona Ivan.

Apesar dos termos parecem semelhantes, não são. Uma empresa com foco no cliente busca coletar dados comportamentais e financeiros para traçar um perfil e então elaborar suas abordagens de venda. Já uma empresa com foco do cliente, a abordagem é baseada, de fato, nas necessidades do cliente; eu, como empresa, “me coloco no seu lugar”.  

Entretanto, um fenômeno tem desviado essa atenção das escolas: os meios eletrônicos. De acordo com Ivan, que há anos atua na implantação de estratégias e projetos de transformação digital, as novas mídias estão fazendo com que a escola se afaste da sua comunidade, do dia a dia do seu bairro, e como consequência, ela não consegue enxergar com clareza o que é necessário para ser relevante no seu entorno.

Contudo, a solução para esse problema é mais simples do que podemos imaginar. “Eu tenho que ter processos, que vão desde os professores aos funcionários do dia a dia, integrados em rodas de conversas e na coleta de conhecimento com a comunidade”, afirma.

A intangibilidade da educação 

Uma das principais características que diferencia produtos de serviços é a sua tangibilidade. Enquanto alguns produtos podem ser tocados e até mesmo experimentados antes da sua compra, os serviços são bens intangíveis, mas ainda assim possuem elementos tangíveis, como o espaço físico, os materiais didáticos e até mesmo os recursos humanos. 

Agora imagine a situação, sendo a criança a consumidora do serviço e seus pais os clientes, por serem responsáveis pelo pagamento do serviço, como é possível mensurar a qualidade final do serviço prestado? Como explica Ivan, quando o produto é intangível, o apego é psicológico:

“A mamãe vai chegar em casa e perguntar “filha, eu estou pagando bem caro, como que foi hoje a aula?”, e ela vai responder que foi legal, “ah, filha, só legal? A criança não consegue verbalizar a riqueza de algo tão tangível [..] A escola tem que ter inteligência de materializar a beleza educacional em alguns processos e fazer com que a família perceba”, ressalta.

A qualidade percebida se relaciona diretamente com a satisfação das expectativas ou, ainda, pela solução do problema, no caso da escola, é a mãe perceber que a sua filha está construindo aprendizados diários. “Eu preciso colocar o que realmente aquela família possa estar precisando na sua expectativa, até porque qualidade em excesso é inimiga da rentabilidade do crescimento”, alerta Ivan. 

Mas afinal, o que é preciso para que uma escola se reposicione e tenha sucesso? O primeiro passo é analisar o próprio mercado. Antigamente a escola só precisava ter uma boa qualidade de ensino para se destacar em meio à concorrência, hoje ela também precisa ser acolhedora e construir uma verdadeira relação de parceria com as famílias. 

O segundo passo consiste na adoção de processos contínuos, como estudos e pesquisas, que sejam capazes de gerar reflexões e embasar decisões estratégicas. Desse modo, a escola tende a se reposicionar naturalmente, de forma gradual, mas também em atenção às mudanças do mercado e da sociedade.

 

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