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Paulo* tinha 14 anos quando resolveu deletar suas contas nas redes sociais. Vítima de Cyberbullying, o garoto não queria ter nenhuma foto exposta na internet. A decisão aconteceu após comentários de colegas da escola ridicularizando sua aparência. O que parecia uma brincadeira deixou marcas no estudante: problemas com autoestima, diminuição no rendimento, faltas constantes e dificuldades para se relacionar no ambiente escolar – fatores que desencadearam o início de uma depressão. Atualmente, Paulo cursa o último ano do Ensino Médio e a ausência nas redes sociais permanece.

Casos como o de Paulo* são cada vez mais comuns, e muitas vezes, com efeitos ainda mais graves. Com a popularização da internet, uso de redes sociais e smarthphones, mensagens e comentários depreciativos encontram no espaço virtual um campo ilimitado e difícil de monitorar.  Esse cenário fez com que o Bullying expandisse para o ambiente virtual, ganhando uma nova configuração: o Cyberbullying.

Por acontecer no ambiente virtual, a impressão é que o problema está diluído e sem formas concretas. No entanto, pesquisas mostram o contrário e evidenciam um aumento exponencial.

Levantamento feito pela empresa de pesquisas Ipsos revela que o Brasil é o segundo país com mais casos de Cyberbullying do mundo, em um ranking de 28 países. Outro dado relevante é a percepção da família na identificação do Cyberbullying. A Organização Internacional ETCB (End to Cyberbullying – Fim ao Cyberbullying) mostra que o Brasil está em 6º lugar no relato de pais que informaram saber de alguma ocorrência nesse sentido. Dos brasileiros entrevistados, 20% disseram ter tido problemas concretos com essas ações.

Ou seja, o desafio é concreto e seus efeitos também. Para Nelson Pedro-Silva, psicólogo, doutor em Psicologia Escolar e professor da Unesp (Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho), é preciso compreender que o ambiente virtual é, sob certos aspectos, reflexo do ambiente e do clima cultural geral que estamos vivendo. O agravante, segundo ele, é que no ambiente virtual há a falsa ilusão de que ninguém saberá quem é o autor das agressões. “Há covardia em se mostrar como o agressor e também possibilidade de divulgar mais amplamente a humilhação do agredido”, avalia.

 

Qual o papel das escolas?

Tristeza, vergonha, raiva e frustração são sentimentos recorrentes nas vítimas de Cyberbullying: 60% das pessoas que sofreram algum tipo de violência virtual relataram que estavam muito ou extremamente perturbadas na última vez que foram alvo de violência no ambiente online (dados da ETCB).

O Cyberbullying pode provocar diversos danos psicológicos, comprometer o desenvolvimento pessoal, de aprendizagem e interferir no ambiente da comunidade escolar. Os sintomas mais comuns são: distúrbio do sono, problemas estomacais, transtornos alimentares, irritabilidade, depressão, transtornos de ansiedade e pensamentos destrutivos. “Há, inclusive, casos de suicídio, frequentemente isso ocorre entre jovens quando fotos ou vídeos íntimos das vítimas são postados na internet”, alerta Pedro-Silva.

 

Confira a importância das escolas na formação emocional dos alunos

 

Nesse sentido, escola como ambiente de aprendizagem e formação para a vida deve estar atenta aos acontecimentos internos e externos, e mais importante, ter em sua rotina ações permanentes para coibir a violência virtual. 

Neide Nogueira, coordenadora pedagógica do “Respeitar é Preciso”, projeto de Educação em Direitos Humanos do Instituto Vladimir Herzog, acredita que valores como dignidade, justiça e solidariedade devem orientar essas atividades. Ela defende que a escola, além de debater sobre o que é Cyberbullying, pode promover esses valores no seu cotidiano, cuidando para que a organização e o espaço de seu ambiente (a dinâmica do espaço, do tempo, da comunicação interna, suas regras e costumes, assim como os conteúdos curriculares) sejam pautados pelo respeito, favorecendo, com isso, que as práticas e relações sejam também respeitosas. “Assim se cria a possibilidade de lidar com eventuais situações de discriminação, de humilhação, de autoritarismo e violação de direitos como oportunidades eficazes de educar”, afirma.

O que fazer ao notar o Cyberbullying na sua escola?

Implementar ações para a promoção da cultura de paz e de medidas de combate ao Bullying nas escolas tornou-se Lei (13.185/2015) que, dentre outras medidas, orienta que escolas públicas e privadas trabalhem sobretudo na prevenção.

Porém, uma dúvida bastante comum entre os diretores escolares é sobre como evitar cyberbullying. A orientação da
advogada Gisele Truzzi, especialista em Direito Digital, é para as instituições de ensino realizarem campanhas de prevenção e combate ao Cyberbullying, com a realização de palestras, workshops e outras atividades que promovam a conscientização dos alunos.

Ao notar a existência das práticas de agressões no ambiente virtual, a escola deve dirigir-se diretamente aos alunos envolvidos e aos pais, informando sobre as consequências jurídicas, psicológicas e sociais desse comportamento. “A premissa legal para a escola atuar nesses casos é que no período em que o aluno se encontra no estabelecimento de ensino, a instituição possui dever de guarda e vigilância pelo aluno, há responsabilidade civil da escola caso a instituição se omita”, afirma Truzzi.  Os pais também podem responder caso estes não tomem providências em relação aos seus filhos.

 

Lei do Bullying nas escolas: saiba tudo sobre o assunto

 

Com o objetivo de incentivar e capacitar para mediação de conflitos e respeito às diferenças, o Instituto Vladimir Herzog desenvolveu uma plataforma para ajudar profissionais da educação e pais sobre o assunto. Nela é possível acessar materiais de apoio e cartilhas digitais. Entender o problema, capacitar equipe escolar e pais é fundamental para tecer uma rede de corresponsabilidades com fortalecimento do engajamento para enfrentar o Cyberbullying.

 

Medidas de proteção em caso de Cyberbullying