Educação inclusiva: quais são as melhores diretrizes na volta às aulas presenciais?
Crianças e jovens com deficiência devem ter o direito de voltar às aulas como os demais estudantes. Esse é um dos resultados de um amplo estudo que o Instituto Rodrigo Mendes acaba de divulgar, chamado “Protocolos sobre educação inclusiva durante a pandemia da Covid-19 – um sobrevôo por 23 países e organismos internacionais”.
Os pesquisadores consultaram especialistas em diversas partes do mundo, como Estados Unidos, Inglaterra, União Européia, Austrália, Hong Kong e outros, que já elaboraram protocolos voltados para o retorno presencial das escolas, além de terem analisado documentos de organismos internacionais como ONU, Unicef, Unesco, OCDE, OMS e Banco Mundial.
A maior parte dos especialistas internacionais considera que “somente o laudo médico de deficiência não deve ser aceito como justificativa para que esses estudantes sejam deixados para trás e impedidos de voltarem a frequentar as aulas presencialmente, uma vez que apenas algumas crianças e adolescentes com deficiência pertencem a grupos de risco da Covid-19”. Segundo o documento, fatores que impedem o retorno às aulas devem estar associados a eventuais comorbidades que tornem esse aluno mais vulnerável ao vírus.
A maior diretriz do estudo é que a análise deve ser caso a caso e a decisão deve envolver uma equipe interdisciplinar que envolva as escolas, a equipe médica, as famílias e também os estudantes.
“Temos que passar por esse colossal desafio que estamos vivendo sem negligenciar ninguém. Viola os direitos humanos e fundamentais das crianças e adolescentes com deficiência presumir um risco aumentado para a covid-19, quando essa correlação não existe. Ninguém pode ser discriminado por sua condição de deficiência, ainda que haja desafios práticos para a reabertura”, diz Luiza Correa, coordenadora de advocacy do Instituto Rodrigo Mendes e doutora em Direito.
Algumas recomendações sanitárias para a volta às aulas:
– Todos os estudantes, professores e funcionários precisam ser treinados sobre a implementação de medidas de higiene.
– Dentro das escolas, os alunos devem manter a distância mínima entre eles, que varia entre 1 e 2 metros.
– Crianças e jovens com deficiência que apresentem dificuldades ou impossibilidade para a execução da lavagem e desinfecção adequadas das mãos precisam receber apoio de um profissional.
– Estudantes que usam cadeiras de rodas e constantemente tocam essas rodas devem lavar as mãos com bastante frequência, além de poderem optar por usar luvas descartáveis e devem ter sempre álcool gel à sua disposição.
– Equipamentos como bengalas, óculos, cadeiras higiênicas, implantes, próteses auditivas e corporais merecem atenção e cuidado especiais.
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Sobre o uso de máscaras
O uso de máscaras por estudantes com deficiência requer uma avaliação caso a caso. Algumas situações abaixo ilustram a complexidade que envolve a questão:
– O uso do acessório prejudica a socialização de alunos com deficiência auditiva, especialmente os que praticam leitura labial ou se comunicam por língua de sinais. Uma possível solução é adotar o uso de máscaras transparentes ou flexibilizar o uso para esses estudantes, seus professores, intérpretes de línguas de sinais e colegas de classe em algumas ocasiões, sempre mantendo o distanciamento social indicado.
– O uso de máscara pode representar maior dificuldade de tolerância para alunos com transtornos do espectro autista. Nesses casos, o uso deve ser flexibilizado, seguindo as demais medidas de higiene e distanciamento social.
– Pessoas que tenham movimentos dos membros superiores reduzidos e não conseguem remover a máscara sozinhas quando necessário não devem ser obrigadas a usá-las, uma vez que há risco de sufocamento.
O estudo identificou grande diversidade de orientações. Para a OMS, o acessório é parte de uma estratégia abrangente contra o contágio, mas alerta que somente o uso de máscara não é capaz de proteger as pessoas. A pesquisa agrupou as escolas de diversas partes do mundo em 3 categorias: as que determinam uso obrigatório de máscaras, as que recomendam o uso em certas ocasiões e as que consideram o uso desnecessário (em países em que os índices de contaminação se mostraram baixos).
Sobre os aspectos pedagógicos na reabertura
O estudo destaca a necessidade de:
– Monitorar a presença dos alunos com deficiência na volta às aulas e, dessa forma, evitar o aumento de evasão escolar dessas crianças e adolescentes.
– Realizar uma avaliação diagnóstica de como foi a aprendizagem desses alunos durante o isolamento social e criar estratégias para reduzir eventuais defasagens, como aulas de revisão e recuperação.
– Não só retomar, mas também fortalecer, todas as atividades diretamente voltadas à inclusão escolar, assim como o planejamento, a oferta de material didático acessível, a disponibilização de cuidadores, intérpretes de língua de sinais e outros profissionais de apoio.
– Manter os estudantes motivados e envolvidos com a sua aprendizagem.
– Envolver as famílias e os próprios estudantes com deficiência nas decisões, para desenvolver de forma colaborativa as melhores maneiras de voltar ao trabalho presencial.
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“As políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência envolvem interseções e tensões entre as áreas da Educação e da Saúde. Em tempos de pandemia e de isolamento social, tais relações tornam-se ainda mais intensas, e demandam um olhar intersetorial e conciliador por parte dos gestores”, diz a coordenadora de advocacy do IRM.
Luiza Correa destaca o esforço, a determinação e a contagiante resiliência de professores, gestores e demais profissionais da educação durante a pandemia. Além disso, ela ressalta que é somente por meio da colaboração que encontraremos soluções para os enormes desafios apresentados: “a profunda complexidade inerente ao momento que estamos vivendo não nos permite criar expectativas em soluções isoladas e pontuais. Acreditamos que é preciso investir no trabalho colaborativo e intersetorial, tendo como objetivo prioritário a preservação da vida e da saúde das pessoas e, ao mesmo tempo, garantir o direito à educação de todos e todas, mantendo sempre a premissa de equidade, de não excluir ou discriminar ninguém”.
Seguindo a tradição, o Instituto Rodrigo Mendes mantem o foco nos bons exemplos, mesmo nos contextos mais difíceis. “Com o objetivo de incentivar e estimular as boas práticas, talvez seja mesmo a melhor resposta que podemos dar para uma outra ameaça que nos cerca, que é a ignorância, a brutalidade e a falta de empatia”, finaliza Luiza.
O Instituto Rodrigo Mendes – IRM
O Instituto é uma organização sem fins lucrativos que tem como missão colaborar para que toda pessoa com deficiência tenha uma educação de qualidade na escola comum. Para isso, o IRM realiza uma série de pesquisas, como essa, além de dar formação continuada e consultoria na área de educação inclusiva em várias partes do mundo. Nos últimos anos, o Instituto formou cerca de 3.000 educadores, impactando diretamente cerca de 260.000 estudantes.
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