A sala de aula é muito mais do que um ambiente de aprendizagem. Muitas vezes, é nela que se notam características importantes de cada aluno e pontos que merecem atenção por parte da equipe escolar e dos pais. Assim, o primeiro passo para o diagnóstico do TDAH – Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – geralmente é dado na escola.
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Estudos mostram que entre 3 a 6% da população mundial sofre com o TDAH, classificada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como um transtorno neurobiológico de causa genética que apresenta características como desatenção, hiperatividade e impulsividade. As características do transtorno aparecem nos primeiros anos da infância, geralmente no início da vida escolar. Sendo assim, envolvem dificuldade na aquisição, retenção e aplicação de habilidades e ou de informações específicas. Esse cenário afeta o desenvolvimento pessoal, social e escolar.
A psicóloga comportamental Ana Carolina Feltrin explica que o transtorno de déficit de atenção (TDA) afeta o funcionamento do córtex pré-frontal, área do cérebro responsável pela atenção, organização, controle de impulsos e pela capacidade de expressar sentimentos. A pessoa com TDA apresenta dificuldades de concentração, problemas na vivência escolar, desatenção, atrapalhando a compreensão de conteúdos que interferem no relacionamento com colegas, professores e até mesmo com os pais.
A diferença entre TDA e TDAH, segundo Ana, está no nível de hiperatividade. Em ambos os casos a criança é agitada, mas o que muda no critério de diagnóstico é a sua intensidade. A hiperatividade é um estado excessivo de energia, podendo ser motora ou mental (fluxo de pensamentos intensificado).
Os principais sintomas da hiperatividade infantil são: estar sempre inquieto, mexendo os pés e as mãos ou os dedos, ficar em pé em situações na qual deveria estar sentado, correr, falar excessivamente e ter dificuldades de participar de brincadeiras calmas. “A criança está sempre correndo, pulando e saltitando ao invés de andar. O sono costuma ser agitado, de modo que se mexem muito. Já a fala é acelerada, podendo se apresentar de forma desorganizada pela pressa de falar”, pontua a psicóloga.
TDAH na escola
A experiência diária dos professores com uma grande diversidade de personalidade dos alunos pode ajudar a identificar sinais do TDAH, desde que o professor esteja munido de informações.
Por isso, a observação é ponto chave, segundo a psicóloga clínica e doutoranda que pesquisa sobre o TDAH, Fernanda Pádua Rezende. Os professores podem observar o comportamento das crianças e notar se ocorre agitação além do esperado para idade, dificuldades de atenção nas tarefas ou para seguir regras e impulsividade nas interações sociais. “No entanto, isto deve ser feito com muito cuidado e cautela, considerado a criança como um ser em desenvolvimento que necessita de atenção e cuidados. Além disso, é preciso ter cuidados para não rotular e estigmatizar”, complementa Fernanda.
Essa observação pode ajudar no primeiro passo para o diagnóstico. Aliás, vale dizer que pode ser solicitado pelos pais da criança um relatório do professor justamente para ajudar a família e o psicólogo na identificação das características comportamentais que esse aluno pode apresentar em sala de aula. O questionário segue um modelo único e pode ser preenchido pelo professor. Esse documento auxilia no diagnóstico clínico que, por sua vez, deve ser feito por médicos.
Outra etapa importante para o diagnóstico é que o TDAH se manifeste na escola e em casa, conforme explica a psicóloga Ana Carolina Feltrin. O modelo de questionário abaixo foi construído a partir dos sintomas do Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Americana de Psiquiátrica, a tradução é validada pelo GEDA – Grupo de Estudos do Déficit de Atenção da UFRJ e pelo Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência da UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Baixe aqui o modelo de relatório para TDAH
A psicóloga Fernanda Pádua Rezende ainda explica que a criança com TDAH pode ter dificuldade na regulação das emoções o que, normalmente, está associado com a impulsividade. Achar o equilíbrio entre o manejo para gerir as regras de modo que a criança consiga cumpri-las, e ao mesmo tempo saber acolher e proporcionar ferramentas de controle emocional, respeitando o tempo da criança, é um caminho para harmonizar a relação e conseguir aplicar as estratégias pedagógicas.
Como ajudar na prática um aluno com TDAH na escola?
A Associação Brasileira do Déficit de Atenção na cartilha da educação escolar “TDAH: uma conversa com educadores”, dá algumas dicas práticas para nortear a postura em sala de aula:
- Estabelecer uma rotina e organização com o aluno.
- Ter um quadro de aviso em sala de aula com lembretes sobre as atividades da semana e datas importantes.
- As crianças com mais desatenção devem ficar perto do professor, de preferência distante das janelas, evitando distrações.
- Fazer um rodízio estabelecendo “alunos ajudantes” do professor. Uma vez que estejam imbuídos dessa responsabilidade vão se esforçar para focar nas atividades.
- Deixar claro as regras e combinados. O aluno se sentirá mais seguro se souber o que se espera dele.
- Avaliar o aluno e estimular a autoavaliação em casos de problemas de comportamento.
- Comemorar cada avanço e pontue os aspectos positivos junto ao aluno.
- Estimular que seu aluno peça ajuda e dê auxílios apenas quando necessário.
Em relação aos professores, é preciso adaptar as atividades no intuito de amenizar os efeitos que possam ser prejudiciais. Embora não exista uma legislação específica em âmbito nacional, medidas já foram adotadas com o objetivo de possibilitar melhores condições em provas. O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), por exemplo, permite uma hora extra para a realização da prova, desde que o aluno apresente laudo médico que comprove o TDAH. Em respeito ao Estatuto da Criança e Adolescente e à Constituição Federal, não pode ser negada a matrícula do aluno em hipótese nenhuma.
Confira a importância da escola na formação emocional dos alunos
Em tramitação no Senado Federal depois de aprovação de redação final pela Câmara Federal, consta o projeto de Lei 7081/10 que obriga o Estado a manter programa de acompanhamento integral de dislexia, TDA, TDAH, ou quaisquer outros transtornos, para estudantes do ensino básico. Por enquanto, o texto não abrange escolas particulares.
Qual a melhor forma de tratar o TDAH?
O tratamento adequado para o TDAH deve ser feito com profissionais habilitados inclui terapias e, em alguns casos, intervenção medicamentosa.
Muito discutido, o uso da Ritalina (Metilfenidato, o principal medicamento prescrito para pessoas com TDAH) é bastante controverso entre os profissionais de saúde.
Existem duas correntes: os que defendem o diagnóstico do TDAH e o uso de medicação para amenizar os efeitos e dar mais qualidade de vida e melhoria do aproveitamento em sala de aula. E uma outra vertente que avalia que o diagnóstico ficou banalizado, com críticas ao uso da Ritalina. Para esse público, o processo de medicalização da educação seria uma alternativa mais fácil e prática para lidar com a falta de recursos para engajar os alunos.
A psicóloga Ana Carolina Feltrin sugere um acompanhamento integrado. “Nem todas as crianças com TDAH precisam de remédio, é preciso que a família desempenhe um papel fundamental na mudança e adaptação de novos hábitos e que na escola, o professor possa auxiliar nos cuidados deste transtorno”. A integração da conscientização de pais e professores e terapia contribuem para o desenvolvimento da criança “a terapia pode ser uma ferramenta chave que sejam trabalhadas questões do foco, autovigilância e estabelecimento de modelos a serem seguidos. Fora da terapia, é importante que uma rotina seja estabelecida”, afirma.
A psicóloga Fernanda Pádua Rezende também endossa o cuidado integrado. “Com intervenções comportamentais no ambiente escolar e familiar é possível que a criança aprenda a regular as emoções, ter autocontrole em relação a impulsividade e pode aprender a reter a atenção por mais tempo. São comportamentos que podem ser treinados, mas exigem esforços por parte dos envolvidos, pais, cuidadores, professores e psicólogos”, argumenta.
A comunicação da escola com os pais deve ser fundamental nessa troca de informações acerca do comportamento dos alunos. Confira aqui como explorar ao máximo a eficiência de cada meio de comunicação escolar.