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Com os hospitais em colapso, as imagens da pandemia em Manaus seguem vivas na mente de Glauce Galúcio. “Foi aterrorizante, não tinha mais cemitérios para colocar as pessoas.” A professora universitária acompanhou a morte de vários amigos, com idade próxima à dela, que tem 40 anos. Viu, ao mesmo tempo, filhos de alguns deles ficando órfãos. Com o objetivo de amparar essas crianças e adolescentes, criou o projeto “Eu Amo Meu Próximo”.

Entre as perdas, a morte de uma ex-colega do ensino médio foi a que mais marcou. “Me abalou muito, porque convivia com ela na época do colégio. Depois acompanhei o casamento e o nascimento dos filhos”, conta Glauce, que relembra trabalhos de escola, dança e idas ao cinema. Neste caso, os órfãos foram três: o mais velho, de 18 anos, uma de 6 e a caçula, de apenas 3.

“Eu me senti responsável. Se minha amiga não está aqui, eu preciso ajudar os filhos dela, acompanhá-los de alguma forma”, diz. Em setembro de 2020, foi Glauce quem se infectou com o mesmo vírus. “É uma doença que nos deixa afetados psicologicamente. Você pensa que vai morrer: está todo mundo morrendo, então você é o próximo”, conta.

O quadro de Glauce, porém, foi de sintomas leves, com comprometimento do pulmão menor do que 25%. Após a recuperação, uma pergunta martelava: “Por que eu sobrevivi?”. Na visão dela, surgia um propósito.

Em janeiro deste ano, quando Manaus passava pela crise do oxigênio, nasceu o “Eu Amo Meu Próximo”, projeto vinculado ao Instituto de Pesquisa e Ensino para o Desenvolvimento Sustentável (Ipeds), com auxílio de estudantes da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e da Universidade Paulista (Unip). “Percebemos que não havia nenhum tipo de assistência aos órfãos”, conta a educadora. “Queremos minimizar a dor e o sofrimento dessas crianças que ficaram órfãs por causa da covid”, explica.

Assim, desde janeiro, a iniciativa proporciona ajuda mensal a crianças e adolescentes que perderam ao menos um dos provedores. Além das cestas básicas, materiais de higiene e fraldas descartáveis, há atendimento psicológico, prestado por profissionais voluntários. Hoje, o projeto atende aproximadamente 150 órfãos no Amazonas, principalmente na capital.

Entre eles a história de Ester Moraes, de 16 anos, é marcante para Glauce. Em pouco tempo, a menina de Manaus perdeu o pai e a avó para a doença, precisando ficar aos cuidados de uma tia. “Ela diz que se sente amparada pelo projeto”, destaca a educadora.

Glauce aproveita para ensinar aos assistidos que todos podem ajudar. Assim, as crianças e os adolescentes ficam atentos a roupas que não cabem mais e a brinquedos que não usam. No dia da entrega mensal, a professora conta que “eles vêm, cheios de orgulho, com as sacolinhas e dizem: ‘Olha, tia, isso aqui é para doar para outras crianças que ficaram órfãs também’.”

Doações podem ser feitas pela chave PIX, CNPJ: 41.640.946/0001-08, ou, presencialmente, no Ipeds, na Avenida Djalma Batista, 4.836, em Manaus. Mais informações pelo telefone (92) 99248-0221. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Leon Ferrari