Especialistas temem possível retorno da cartilha de alfabetização
Especialistas em educação apontam possíveis retrocessos na alfabetização brasileira. A crítica se volta para uma possível priorização do método fônico, que primeiro ensina os sons de cada letra, para alcançar a leitura e a pronúncia completa da palavra, a partir da mistura de sons. Os estudiosos defendem que o processo de alfabetização deve ser diverso e levar em conta o contexto de cada sala de aula e de cada município.
O assunto foi tema de videoconferência promovida nesta quarta-feira (18) pela comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha os trabalhos do Ministério da Educação (MEC), a pedido da deputada Tabata Amaral (PDT-SP).
A parlamentar se disse preocupada com um estudo recente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), segundo o qual a Política Nacional de Alfabetização (PNA) possui incompatibilidades com princípios norteadores da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Na reunião, a coordenadora de Programas e Projetos de Alfabetização do Cenpec, Maria Alice Junqueira, explicou que a BNCC não adota um método específico, mas metodologias sugeridas, colocando sempre o sujeito como centro da aprendizagem. Já a PNA pode induzir à adoção do método fônico.
“O PNLD [Programa Nacional do Livro Didático] traz orientações para que as obras pedagógicas didáticas que começarão a chegar às escolas no fim do ano estejam alinhadas à Política Nacional de Alfabetização. Quando se alinham as obras, vamos encontrar nos livros propostas de recitação do alfabeto e associação de letra inicial e sua grafia a um objeto”, detalhou Maria Alice. “Ou seja, é muito parecido com o que a gente tinha nas cartilhas antigamente. Não é isso o que a gente entende como concepção de alfabetização, pelo menos desde os anos 1990”, acrescentou.
Pensamento crítico
Na avaliação do presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Luiz Miguel Martins Garcia, o letramento deve avançar das cartilhas, para incluir também o letramento digital, o pensamento crítico e o educacional.
“A alfabetização é um processo que se inicia lá na mais tenra idade, obedecendo ao percurso social, histórico e cultural da criança. Isso está para muito além do processo reducionista de uma escrita do nome ou de algumas palavras”, criticou Garcia. “Não existe melhor método. Existe momento, existe situação. O professor, ele precisa estar pronto para praticar diferentes formas.”
Tabata Amaral também defendeu a diversidade de abordagens pedagógicas. “Há uma preocupação muito grande porque, na hora em que se aponta para apenas um método de alfabetização, a gente tem um receio sobre o impacto disso nas avaliações e nas aferições de aprendizagem dos estudantes brasileiros de forma mais ampla”, declarou.
O Ministério da Educação foi convidado para a videoconferência, mas não mandou representante.
(*Por Noéli Nobre / Agência Câmara de Notícias)