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Desde 2015, existe no Brasil uma lei antibullying, válida tanto para escolas públicas quanto para as privadas. Ela foi sancionada como uma resposta aos casos de ataques nas escolas. Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da USP, explica que essa lei tem um grande mérito, ela determina o que é o bullying, classifica, significa e torna factível a compreensão nacional do que é o bullying. Segundo o professor, “o bullying é a percepção sistemática, uma perseguição que pode ser feita em pequenas agressões, em atos de coação moral. Então, essa percepção precisa ser sistemática para se determinar como bullying.”

Em virtude do grande número de ataques em 2023, as escolas privadas, especialmente as de altíssimo custo, começaram a tomar atitudes em relação ao combate ao bullying. A principal delas é um princípio da educação nacional inscrito na Constituição, que é a gestão democrática. “Nada previne mais o bullying do que a prática da gestão democrática, ou seja, os estudantes participarem da gestão da escola, serem ouvidos na gestão da escola e principalmente a resolução pacífica de conflitos, que também é o mecanismo que é fortalecido pela gestão democrática”.

O professor Cara considera a lei pouco prática; ele coordenou um relatório de violência extrema nas escolas, juntamente com um grupo de especialistas, e desse encontro foi elaborado um documento sobre o tema. Esse conjunto de especialistas determinou que era imprescindível melhorar essa lei antibullying para que ela se tornasse mais prática, mais pragmática. Para isso, é necessário uma regulamentação mais precisa para poder gerar uma ação mais factível e mais eficaz por parte das escolas.

Maurício Stegemann Dieter, professor de criminologia do Departamento de Criminologia da Faculdade de Direito da USP, lembra que, em janeiro deste ano, foi aprovado um projeto de lei que instituiu medidas adicionais de repressão ao bullying, no qual foram incluídos dois artigos no Código Penal.

Bullying é crime

O artigo 146A e o seu parágrafo único tratam da criminalização do bullying, ou seja, ele passa a ser considerado crime no Código Penal. O bullying, apresentado na sua versão de uso tradicional, está sujeito a uma pena de multa; ele não é nada mais grave do que isso, até porque todas as formas de praticar bullying já seriam crime, como ameaça, lesão corporal, injúria etc.

O criminologista destaca que “o problema é o parágrafo único, que prevê que, se o bullying é praticado por meio de redes sociais ou rede de computadores, está sujeito a uma pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa, se não constituir crime mais grave. E esse é um crime que preocupa muito, porque ele é feito de maneira precipitada, é um crime com uma pena enorme e que, embora as situações de bullying virtual possam ser bastante graves por afetar crianças e adolescentes, vai trazer para o âmbito escolar uma disputa policial, um momento de intervenção do sistema de justiça criminal. Eu não tenho convicção de que isso é vantajoso no processo pedagógico.”

O professor está preocupado com a ação da Lei 14.811/2024, que acrescenta novos aspectos de criminalização. Ele afirma que é preciso ficar atento à forma de como ocorrerá a inclusão do bullying no Código Penal e de como irá se projetar no ambiente pedagógico.

“Me parece uma temeridade, uma criminalização feita do ponto de vista da concretude, praticada diretamente com uma pena de multa, mas considerada crime no Código Penal se praticada por meio virtual, com uma pena de reclusão de dois a quatro anos, o que parece criar uma divergência, uma discrepância na própria avaliação da lesividade da conduta. Acho que é um crime mal feito, é uma inclusão ruim e que certamente não ajuda a enfrentar o tema com seriedade, com razoabilidade, com decência, que traz o Código Penal, traz a repressão policial para uma questão que é, essencialmente, a ser tratada dentro da lógica não conflitiva. Deveria ser dialogada, deveria ter uma condição para resolver isso, principalmente porque afeta crianças e adolescentes”.

Lei antibullying: educação e diálogo

Leila Tardivo, professora do Instituto de Psicologia da USP, lembra que o bullying sempre existiu e que hoje em dia é mais frequente entre crianças e jovens. “O bullying que tem a ver com violência e assédio entre iguais traz consequências. Há pessoas que ficam marcadas para o resto da vida. Então, é importante uma lei antibullying, ela pode coibir. As atitudes, a gente vai mudar com educação, com conversa, com diálogo. Então, é importante conscientizar crianças e jovens do direito dos outros, dos valores, da solidariedade. E as pessoas falam ‘é só uma brincadeira’, não, não é só uma brincadeira quando só um ri, quando um só se diverte. Essa consciência não se tinha antigamente.”

A psicóloga lembra que, muitas vezes, quem comete o bullying também já foi vítima de violência. Ele prejudica as vítimas e os outros que são testemunhas passivas. “Muitas crianças que cometem bullying já sofreram em outras situações. Muitas vezes vêm de ambientes violentos, onde o que predomina é o grito, às vezes a violência física. Então, eu acho que esse é um momento interessante para pensar”. A professora lembra que, além da lei é necessário haver uma política pública, uma noção de aprendizado, dos valores que formam uma personalidade saudável e produtiva.

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Imagem: Freepik
Fonte: Jornal da USP