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Desde que as aulas presenciais foram retomadas neste ano, muito se tem falado sobre o aumento dos casos de depressão e ansiedade entre os alunos. Mas, diante deste contexto, qual o papel da escola para trabalhar a saúde emocional dos estudantes?

Essa foi a primeira pergunta que o Escolas Exponenciais fez para a Taís e a Roberta Bento, que são educadoras, especialistas na relação Família e Escola e fundadoras do SOS Educação, durante uma entrevista exclusiva.

“O papel da escola continua a ser a educação para a vida. E para isso, a parceria com a família é ainda mais necessária do que nunca”, afirmaram.

Confira na íntegra esse bate-papo, que aborda os cuidados necessários com saúde mental dos alunos, professores e diretores de escola. 


Escolas Exponenciais: Pesquisas indicam que, com a pandemia, aumentaram os casos de depressão e ansiedade em crianças e adolescentes. Diante desse atual cenário, qual o papel da escola?

SOS Educação: Não somente os estudantes, como também os professores ainda sofrem as sequelas da pandemia. O período prolongado em que nossas crianças e adolescentes ficaram fechadas dentro de casa, sem o convívio com familiares, colegas de classe e equipe de profissionais da escola acentuou algumas dificuldades que já vinham sendo detectadas. 

A convivência com outros colegas de faixa etária semelhante, o enfrentamento dos desafios que fazem parte da vida no mundo concreto, como paciência, respeito às diferenças, persistência e capacidade para lidar com frustrações, tudo isso se tornou um grande emaranhado no qual estão envolvidos família, escola e, especialmente, os alunos. 

O papel da escola continua a ser a educação para a vida. E para isso, a parceria com a família é ainda mais necessária do que nunca. Encontrar o equilíbrio para que possa fazer diferença na preparação dos alunos para resolver problemas que fazem parte da vida é fundamental. 

Enquanto os profissionais da educação não tiverem o cuidado necessário para retomar o próprio equilíbrio emocional, nossas crianças seguirão sofrendo não só com as lacunas de aprendizagem que ficaram, mas principalmente com os desafios de encontrar prazer em atividades que são parte do dia a dia, entre elas, estudar, aprender, conviver.

É papel da escola ajudar a família a entender o papel fundamental que a rotina dentro de casa tem tanto no restabelecimento do equilíbrio emocional e cognitivo, como na retomada da capacidade plena de aprendizagem de nossas crianças e adolescentes. 

Ao mesmo tempo, os professores precisam de suporte para que eles próprios possam se reencontrar e ter os recursos necessários para cumprir o papel na educação dos seus alunos, que, vale lembrar, não e o de tratar depressão e ansiedade. 

Cabe à escola oferecer oportunidades para que os alunos se desenvolvam em todos os seus aspectos, inclusive na aprendizagem dos conteúdos e nas competências para a vida. E também encaminhar para atendimento com profissionais especializados os casos mais graves de ansiedade e depressão. Para isso, a parceria com a família é essencial. 

Escolas Exponenciais: Com a retomada das aulas presenciais, também aumentaram os casos de violência e agressão entre alunos no ambiente escolar. Qual o papel da escola para a redução desses casos? 

SOS Educação: Há uma responsabilidade a mais, dentre as tantas que já sobrecarregam os profissionais da educação, que quando assumida ajuda a aliviar toda a pressão e angústia que os casos de bullying e agressão vêm gerando nas escolas: educar a família para a parceria com a escola. Sem a parceria com os pais dos alunos, a missão da escola se torna quase impossível. Muitas famílias, contudo, não sabem como ajudar. 

Algumas acabam agravando a situação de estresse dos filhos, ao usar da violência e agressão contra a própria criança ou adolescente quando são notificadas sobre comportamentos inadequados na escola. 

Outros, também na busca de alternativas para “consertar” o que não vai bem, jogam na professora, nos colegas, na escola a culpa pelas posturas e atitudes agressivas dos filhos. Em ambos os casos, o peso se torna enorme para a escola e todos saem prejudicados. 

A redução desses casos requer um trabalho continuado de comunicação constante com a família. E também passa por atividades que estimulem nos alunos a participação ativa, o trabalho em equipe, o incentivo à resolução de problemas e o autoconhecimento. 

Ter um trabalho sério e com parceiros confiáveis nas áreas de integração da tecnologia e desenvolvimento socioemocional são caminhos sem volta para a escola que tem como foco o envolvimento dos alunos.


Escolas Exponenciais: O fortalecimento da relação escola-família se faz ainda mais necessário para desenvolver um trabalho focado na saúde socioemocional? Por quê?

SOS Educação: Sim! Mesmo antes da pandemia a relação família-escola já era fundamental para conseguirmos juntos enfrentar os desafios que a vida moderna trouxe para a formação plena de nossas crianças e adolescentes. 

Depois de um período tão longo de incertezas e angústias geradas pela pandemia, essa parceria se tornou indispensável. Não somente porque a escola e a família precisam enfrentar juntas tantos desafios, mas também porque é essencial que nossas crianças e adolescentes sintam a segurança que posturas coerentes e coordenadas entre professor e pais gera. 

Quando crianças ou adolescentes sentem que há uma ruptura e incoerência entre o que a escola coloca como limites e responsabilidades e aquilo que os pais comentam ou estabelecem também dentro de casa, fica ainda mais difícil para que possam ser estudantes participativos, interessados e conscientes do potencial que possuem. Autoestima e regulação das próprias emoções são prejudicados, tornando mais difícil a relação com os estudos, com os colegas, professores, gestores e até mesmo com a família.

 

Fundadoras da SOS Educação falam sobre o papel da escola diante os casos de depressão e ansiedade entre alunos e professores
Fundadoras da SOS Educação falam sobre o papel da escola diante os casos de depressão e ansiedade entre alunos e professores

Escolas Exponenciais: São mais de dois anos intensos e repletos de desafios para a educação. Muitos professores estão cansados e até desanimados. Como a escola deve olhar para seus educadores? Como cuidar da saúde mental dos docentes?

SOS Educação: Os professores precisam desesperadamente de ajuda para que possam retomar o equilíbrio emocional e psicológico, tão corrompido pelos desafios que a pandemia trouxe. 

Somente as poucas semanas de férias ou recesso não são suficientes para que os profissionais do corpo docente voltem ao segundo semestre reabastecidos de energia. As reuniões pedagógicas, as conversas individuais e o acompanhamento das aulas não devem focar somente na capacidade técnica do professor. 

Aspectos como o sentimento de pertencimento à equipe, empatia por parte da equipe gestora e pequenos ajustes no dia a dia da escola podem amenizar bastante a exaustão e angústia que os professores vêm sentindo há tempos.

Considerar o professor como um ser humano, com todo o peso que cuidar dos próprios alunos, enquanto viviam também seu próprio luto, perdas, medos e incertezas sendo reconhecido é um ótimo começo.

Fazer dos ambientes da escola em que os professores têm algum tempo para si próprios espaços mais claros, arejados e alegres também ajuda nessa retomada que ainda vai levar tempo. 

 

Escolas Exponenciais: E como os diretores podem aproveitar o período de recesso para preparar a escola para o segundo semestre, pensando no desenvolvimento de ações que visam a saúde emocional de alunos e professores?

SOS Educação: Em primeiro lugar, tirando um tempo para cuidarem da própria saúde física e emocional. A equipe de gestores escolares foi a que mais absorveu os impactos ao longo e no pós período de aulas remotas e retomada da aulas presenciais. Ninguém pode dar aquilo que não tem!

Se a equipe de Coordenadores e Diretores da escola não tiverem um tempo para recuperar o próprio equilíbrio, o segundo semestre escolar será ainda mais pesado e com tendência a conflitos eclodindo a todo momento.

Não esperar até que sobre tempo é a única saída para que os diretores e coordenadores da escola consigam recarregar a própria energia, que será muito necessária nos próximos meses. 

Além do autocuidado, investir na formação dos professores, para que possam enfrentar os desafios que permanecem e na comunicação eficaz com a família são mais dois fatores que podem tornar o segundo semestre do ano letivo de 2022 em um período mais leve, repleto de aprendizados e memórias boas para todos: alunos, famílias, professores, equipe de profissionais da escola e para os próprios gestores!