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Os termos mudaram, a legislação evoluiu, mas nem tudo é um mar de rosas, e a pessoa com deficiência continua na luta pela inclusão e acessibilidade. O resultado dos dados obtidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), voltada para pessoas com deficiência, revela persistência na desigualdade em setores como a educação e o mercado de trabalho, de maneiras que ainda exigem atenção e ação mitigadora.

Segundo os dados da mostra, no País o índice de analfabetismo para pessoas com 15 anos ou mais de idade oscila próximo a 5,7%. Contudo, o indicador aumenta quando se restringe às pessoas com deficiência, com uma taxa de 19,5% contra 4,1% daquelas sem deficiência.

Para Marcela Dias de Oliveira, enfermeira e mãe da Maria Dias de Oliveira, que tem 8 anos e nasceu com uma síndrome genética rara e com uma deficiência auditiva, o desafio reside em achar uma escola que não apenas aceite, mas também esteja preparada para atender às necessidades de sua filha.

“A escola em que Maria estuda atualmente foi a única instituição que a acolheu após a pandemia. Minha intenção era matriculá-la em uma escola próxima de casa, mas a resposta demorou quatro meses, e eles alegaram que não teriam condições de acolher minha filha por ela ser surda”, relata.

Preconceito na educação enfrentado no dia a dia

Ao buscar apoio da Secretaria de Educação para matricular Maria na escola que queria, Marcela enfrentou um empecilho com a resposta da Secretaria: “Por que você quer matricular sua filha em uma escola que não a quer?”. O que a acalmou foi a escola atual, que aceitou a matrícula de Maria de maneira positiva, com promessas de um plano de educação inclusiva.

No entanto, a realidade enfrentada pela criança ainda é um desafio. “Ela está terminando o segundo ano do fundamental, mas ainda não está alfabetizada. Não há professores que falem Libras e a escola carece de um tradutor para a linguagem de sinais”, comenta a mãe.

Anna Maria Padilha, pesquisadora de inclusão social e escolar das crianças e adolescentes com deficiência, atribui as dificuldades ao preconceito e destaca a necessidade de uma educação inclusiva desde cedo para promover a convivência entre pessoas com e sem deficiência.

“A sensibilidade apenas na lei ou nas chamadas políticas públicas não resolve. O maior desafio é o preconceito e o atraso em relação à crença de que há uma diferença entre as pessoas. Não tem outra saída: ou se educa e ensina que todos são iguais, ou a desigualdade continua sendo um problema”, declara.

Inspiração em países desenvolvidos

A especialista ainda disserta que os países desenvolvidos são exemplos a serem seguidos, já que existem escolas e profissionais capacitados para lidar com a diversidade e promover a inclusão de forma eficaz.

Valéria Medalha Gonçalves é paraeducadora e era voluntária na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) no Brasil, mas agora trabalha com alunos com deficiência nos Estados Unidos, na Califórnia, e nota várias diferenças na educação inclusiva. “Há mais de duas décadas, ouço falar sobre inclusão nas escolas no Brasil, mas até o momento vejo apenas discursos. Não conheço escolas que estejam verdadeiramente preparadas para essa forma de inclusão, seja nas instituições públicas ou privadas”, expressa.

Ela observa as adaptações na estrutura física das escolas no Brasil, mas acredita que o País ainda está longe de alcançar a formação ideal de profissionais especializados. Comenta que, na Califórnia, 60% da verba destinada à educação é direcionada para a educação especial e ressalta que, embora tenha conhecido pessoalmente poucos Estados norte-americanos, a política de acessibilidade está presente em todos os lugares que visitou fora da Califórnia.

“Toda criança com necessidades especiais matriculada em escolas públicas recebe, em média, de US$ 4 mil a US$ 6 mil mensais. Elas têm acesso a atendimento médico e transporte gratuito. Nas escolas, são assistidas por diversos profissionais, incluindo enfermeiros que administram medicamentos necessários durante o período escolar, fisioterapeutas, terapeutas da linguagem, psicólogos, suporte comportamental, nutricionistas e educadores físicos especializados. E todo esse suporte faz uma grande diferença”, enfatiza Valéria.

Julia Valeri/Jornal da USP

Foto: Imagem de Freepik.

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