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Seguindo um caminho parecido com o trilhado por algumas faculdades, as escolas de ensino básico também entraram na mira de grandes investidores. Em busca de maior competitividade por meio de ganhos de escala, recursos tecnológicos e possibilidade de intercâmbio com universidades de outros países, muitas instituições de ensino superior enxergaram essas fusões e investimentos nas escolas como um meio de sobrevivência.

A expansão das faculdades Anhanguera foi o termômetro mais perceptível da consolidação desse setor. Sua fusão com o grupo Kroton, em 2014, fez da rede a maior empresa de ensino superior do mundo, com cerca de 1 milhão de alunos, segundo dados da própria instituição.

 

Investimentos nas escolas do Ensino Básico

Ocorre que a materialização desses investimentos em universidades privadas despertou o olhar de grandes investidores para um nicho ainda mais pulverizado, o de escolas básicas particulares. Embora o número de aquisições realizadas nos últimos anos ainda seja considerado inexpressivo num contexto geral, esse tipo de transação começa a se intensificar, especialmente, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte.

Esses são os principais estados que entraram no radar do grupo inglês Cognita School, na última década. Há seis anos no Brasil, por conta da compra da escola paulistana PlayPen, o grupo Cognita traçou um planejamento de longo prazo para os negócios em segmento no país.

Josep Caubet, CEO da Cognita School na América Latina, diz que trabalhar com essa categoria exige um ritmo diferente em comparação ao que foi feito com o ensino superior. “Se levamos cerca de 16 anos para formar um aluno, apenas no fim deste ciclo saberemos se nosso trabalho foi feito com louvor. Antes disso, temos apenas teorias”, diz.

 

O que atrai os investidores?

A partir deste pensamento, o executivo explica que, hoje, o pano de fundo dessas negociações está totalmente ligado ao poder de criação de valor e qualidade dessas unidades de ensino. Ou seja, excelência e propósito têm um peso maior no potencial financeiro de cada instituição, do que exatamente, o número de matrículas, valor de mensalidades ou custos operacionais.

“Nas aquisições, o principal ponto que olhamos é a cultura da escola, e não o balanço”.

Hoje, a Cognita responde por 70 escolas espalhadas pela Europa, América Latina e Sudeste Asiático, com cerca de 38 mil alunos matriculados. Diante desses números, surge a seguinte questão: o ensino básico brasileiro também passará por essa consolidação? Na opinião de Caubet, é possível que sim. Mas, ainda há muito a ser percorrido. Para o executivo, se bem conduzida, essa transformação será uma espécie de ponte para que a educação brasileira rompa algumas barreiras.

Assim como acontece com a qualificação dos alunos com o ensino bilíngue, a ideia é que professores também passem por intercâmbios a fim de tornar essas escolas globais com métodos de aprendizagem nacionais e internacionais.

 

Caso Escola da Vila

Com a finalidade de se tornar sinônimo de qualidade, muitas redes de ensino cultivaram verdadeiros tesouros ao longo do tempo, segundo Caubet. Desenvolveram metodologias personalizadas e construíram um elo ideológico e emocional com pais, alunos e professores.

Em São Paulo, a construtivista Escola da Vila pode ser considerada uma referência neste sentido. Há pouco mais de um ano, o grupo Bahema passou a controlar 80% da instituição, em uma operação de R$ 34 milhões.

Na época em que foram procurados pelos investidores, no final de 2016, os gestores do colégio já pensavam em alternativas de crescimento. Havia uma preocupação em relação à perenidade da escola, ao processo sucessório e também com a necessidade de investimentos constantes, segundo Sônia Barreira, diretora-geral da Escola da Vila.

“Nosso temor era que nossa instituição não conseguiria fazer frente a essas necessidades num cenário de alta competição no mercado educacional”.

As fragilidades apontadas por Sônia não se restringem aos mantenedores da Escola da Vila. De acordo com Bruno Belliboni, diretor de operações da Bahema, na maioria das vezes, são esses os motivos que levam um colégio a um processo de fusão ou aquisição.

Belliboni observa que na maioria das vezes, essas escolas possuem dívidas e nunca desenvolveram um verdadeiro plano de negócios. Resultado de uma gestão familiar, que tem como fundadores e mantenedores profissionais com formação na área pedagógica. Com base nisso, o discurso que sustenta os negócios conduzidos pela Bahema é que a parceria entre escolas e investidores garanta boa gestão e projetos pedagógicos bem definidos para liderar um processo de expansão seguro.

“O segmento é rentável, crescente e de baixo risco. Se há boa gestão, as escolas ganham em competitividade, eficiência, inovação e organização. Não tem como dar errado”, diz Belliboni.

 

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Riscos e preocupações

Tamanha profissionalização preocupa Mônica Capuzzo, diretora e mantenedora da escola Projeto Vida. Assim como a Escola da Vila, a gestora também sofre com os efeitos da competitividade do mercado e acredita que essas fusões podem atrapalhar ainda mais a sobrevivência de pequenas escolas com propostas educacionais consistentes.

Um dos pontos levantados por Mônica é que com disponibilidade de grande capital, esses fundos de investimento podem causar uma grande oscilação no mercado, já que oferecem propostas bem comerciais.

A educadora questiona se com a multiplicação dessas aquisições ainda haverá espaço para pequenas e médias independentes. “Os fundos de investimentos têm a possibilidade de trabalhar por alguns anos no vermelho para dominar o mercado, enquanto outras fecham as suas portas”.

Embora considere o crescimento desses movimentos de mercado na educação privada como algo inevitável, Mônica aponta que o método ainda apresenta contradições. A mais preocupante, na opinião da mantenedora é a de que a formação de grandes grupos de educacionais acabe por padronizar todo o sistema de ensino.

“Me interessa saber qual é a real situação deste mercado, quais serão as consequências dessas ações num futuro próximo e como podemos garantir que a proposta pedagógica de cada colégio será mantida”, afirma.

Cada vez mais próximas da realidade de gestores escolares, essas negociações ainda dividem opiniões e levantam algumas polêmicas. A recorrência deste assunto leva Vahid Sherafat, CEO da ClassApp, a acreditar na importância da comunidade escolar se aprofundar cada vez mais nesta discussão. Para Sherafat, os gestores precisam se atualizar e entender melhor essa experiência para se necessário, saber decidir como, quando e a quem eles querem se aliar.

E você? O que pensa acerca desse assunto polêmico? Deixe sua opinião nos comentários!