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É possível fazer planejamento no meio de uma crise como a que estamos vivendo? De uma hora para a outra, a pandemia do novo coronavírus obrigou escolas no mundo todo a suspender as aulas presenciais para proteger seus alunos e funcionários da Covid-19. Porém, passado o primeiro momento de urgência, em que fecharam as portas e garantiram a segurança e o bem-estar de sua comunidade, as instituições de ensino precisam se planejar para enfrentar a crise econômica mundial decorrente da pandemia, em meio a um cenário incerto, ainda em evolução no Brasil.

Com o objetivo de ajudar gestores a lidarem com a situação da melhor forma possível, conversamos com Ivan da Cunha, diretor de Consultoria e Estratégias Corporativas da Apoio Estratégico. A consultora de comunicação e marketing para escolas particulares em São Paulo, que existe há mais de 20 anos, tem em seu portfólio de clientes mais de 1.000 escolas, redes de ensino e organizações. Uma das especialidades da empresa é justamente gestão de crise.

“Quando você faz a gestão de crise, duas coisas são muito importantes. Primeiro: identificar a densidade da neblina, para saber a que passo você vai continuar a caminhada. Quanto mais densa é essa neblina, mais cuidado você precisa ter e mais curtos os passos que você precisa dar. É o que está acontecendo agora. Nós ainda não temos uma visão de futuro, nós não podemos dar passos pensando em 2,3,4 meses. Segundo: antes de tomar qualquer decisão, ou seja, escolher o caminho a ser trilhado, você deve analisar os riscos que você terá ao decidir por determinado percurso e tomar as medidas necessárias para mitigar os riscos nesse caminho. O importante, então, no caso de uma escola, é que ela esteja consciente do impacto que vai gerar com a sua tomada de decisões, seja dando férias, optando pelo ensino a distância, EAD e depois férias…” diz Ivan da Cunha.

 

Propósito e empatia com a comunidade escolar

Para tomar decisões no momento de uma crise internacional que afeta a todos, é preciso adotar uma abordagem que leve em consideração todas as partes envolvidas: gestores, professores, funcionários, alunos, pais, fornecedores. É fundamental equilibrar os interesses de todas as partes envolvidas na comunidade escolar, demonstrando empatia.

 

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“Os Procons e advogados defendem que os contratos devem ser mantidos e que as escolas têm direito de cumprir sua parte no contrato, optando por EAD ou reposição de aulas depois da crise. Mas nós estamos vivendo um momento em que a empatia é muito necessária, um momento em que as pessoas precisam fazer negociações. O que a gente aconselha nesta hora é negociar caso a caso, com muita compreensão.”

O consultor aconselha também que as negociações sejam feitas por telefone, para que e-mails não sejam encaminhados ou replicados em redes sociais por pessoas que não dividem o propósito de negociação caso a caso. Nesse sentido, Ivan também orienta que as escolas tomem cuidado com oportunistas que querem aproveitar o momento para reduzir as mensalidades de seus filhos, sem necessidade real para isso.

O especialista destaca ainda outro tipo de caso que justifica a negociação individual: muitos pais já contam com grandes descontos ao longo do ano letivo. Nesses casos, as escolas não teriam como fazer um nova redução neste momento, que já poderia chegar a 70% em alguns casos.

Outra recomendação de Ivan da Cunha, para a renegociação de mensalidades, é que os ajustes sejam por curto prazo, por exemplo 2 ou 3 meses, “esperando que a situação se normalize em breve. É preciso muito cuidado ao fazer essa análise financeira diante da crise, para não sair mexendo onde não se deve, sob pena de não conseguir retornar depois dessa situação,” afirma.

 

A relação com fornecedores: um peso, uma medida

“Assim como as escolas não querem que famílias sejam oportunistas neste momento, os gestores também não podem fazê-lo, não se pode ter dois pesos e duas medidas. É um ciclo complicado para todo mundo. Um gestor, sem saber qual vai ser a inadimplência, não pode sair ligando para todos os fornecedores pedindo 50% de desconto ou cancelando contratos.”

Ivan chama atenção para a questão ética, além da boa gestão financeira. “A boa gestão hoje passa por uma gestão ética”. O consultor recomenda que os gestores vão medindo a inadimplência e, com olhar de projeção a médio prazo, renegociem seus contratos.

Ivan chama a atenção também para o fato de que muitas instituições já pudessem estar tendo problemas de inadimplência e não podem agora culpar todas as faltas de pagamentos à crise do coronavírus. “Se a escola já tinha um padrão de inadimplência de 12% e agora passou para 20% não é que subiu de 0% para 20%, aumentou 8 pontos percentuais.” 

É preciso buscar um mecanismo justo para negociar com seus parceiros, identificando o verdadeiro tamanho do rombo, fazendo uma projeção e criando um plano de contingência com seus fornecedores. 

Ivan lembra que na crise de 2015 (quando o país sofreu uma forte recessão econômica, com uma contração de 3,5% da economia), muitas escolas cancelaram abruptamente diversos contratos, como os de Comunicação e de Marketing. 

“As escolas que fizeram isso tiveram problemas depois, pois se esqueceram que, no final do ano, precisavam novamente vender para captar novos alunos – e que não tinham mais nenhuma ferramenta para isso. É preciso saber onde cortar custos. A vida vai voltar ao normal”.

 

Sobre projetos de lei para reduzir obrigatoriamente as mensalidades

O fechamento temporário das escolas fez surgirem diversos projetos de lei, para obrigar instituições de ensino da rede privada a reduzir suas mensalidades em 30%, durante o período de suspensão das aulas por causa do novo coronavírus.

“Por causa desses projetos também oportunistas, que não foram aprovados, é importante que os mantenedores estejam ligados a seus sindicatos, para estabelecer mecanismos de pressão. Muitos desses projetos justamente já caíram por causa dessa pressão conjunta.”

A Apoio Estratégico está dando orientações gratuitas até julho para escolas que precisem de apoio para enfrentar a crise:

“É uma forma de contribuirmos para que as escolas possam superar este momento inédito que estamos vivendo – e que vai passar”, completa Ivan.

 

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