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Michel e a esposa precisavam que as duas filhas pequenas, de 3 e 5 anos, aprendessem inglês. Contrataram uma professora particular, mas essa metodologia não estava sendo capaz de fazer com que as meninas evoluíssem. Até que o casal recebeu a dica de um aplicativo de aulas pelo iPad. O resultado foi tamanho que a diretora chamou os pais para perguntar o que eles haviam feito para que o inglês das meninas melhorasse tanto.

Com o resultado dentro de casa, Michel se reuniu para conversar com o primo da esposa, que tem uma empresa de software na Califórnia. “Começamos a conversar sobre o futuro da educação online, que precisava ter uma plataforma mais interativa, já em 2018, e nos unimos”, conta. 

E foi assim que surgiu a 2be Live, uma plataforma de ensino 100% remoto focada em melhorar a experiência do aprendizado.

Essa não foi a primeira ideia de startup de Michel Eberhardt. Anos antes ele co fundou nada menos que o iFood, junto com o irmão.

Mas como uma startup pode ajudar as escolas?

Quando pensamos em startups, logo nos vem em mente a ideia de um modelo de negócio super inovador e super tecnológico. E como, exatamente, esse pensamento disruptivo poderia ser empregado dentro das escolas, uma instituição milenar?

Atualmente CEO da 2be Live, Michel acredita que o principal papel das startups é não ter medo de testar as ideias.

“Observamos que uma das coisas das startups é você começar a testar as coisas rapidamente em nichos, em segmentos, onde você consegue fazer um teste AB. Você já sabe como estava indo e faz uma inovação. Na startup, você consegue testar se tem aderência ou não, e se tiver aderência você traz para a operação total. Se não tem aderência você tira e testa alguma outra coisa”, sugere. “Isso para mim é um dos segredos de startup versus as empresas normais”.

Outra dica para transformar o empreendedorismo em inspiração para as escolas é conseguir identificar tendências que estão acontecendo no mundo e “tropicalizá-las” para funcionarem no Brasil.

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O que as startups podem ensinar às escolas?

“O mercado brasileiro é bem diferente de alguns outros mercados no mundo. Tem que pegar essas ideias, adaptar algumas coisas e mudar outras, e aí trazer para o mercado brasileiro”, explicou.

Ele conta que começou a desenvolver a 2be Live em 2018, em um momento em que não havia pandemia ou qualquer sinal de que a educação fosse passar por grandes revoluções. A plataforma do 2be Live foi desenvolvida dentro do conceito de Sharing Knowledge Economy, a economia da troca do conhecimento. “Nós acreditamos que todos temos um conhecimento e esse conhecimento tem um valor para alguém”, resumiu Michel. Assim, qualquer pessoa pode ser “professor” dentro da plataforma, cobrando o quanto achar justo.

Michel veio para o Brasil no começo de 2020 para lançar a 2be Live como um teste no mercado nacional. A ideia era vender a plataforma para as escolas como uma opção para as aulas de reforço, sabendo do alto custo de se manter o colégio para atender um número pequeno de alunos. Mas aí chegou a pandemia.

Com isso, foi preciso adaptar a plataforma para que mais alunos pudessem, por exemplo, entrar em uma mesma sala virtual. Antes esse número era de 10 e foi aumentado para 30 pessoas por sala. Outra ferramenta desenvolvida é conseguir avisar o professor caso o aluno esteja com outras telas abertas no computador, disputando a atenção no momento da aula. O professor ainda consegue ligar e desligar o áudio/vídeo dos alunos, consegue desenhar em cima das abas, dentre outras ferramentas.

“Além da 2be Live ter, na plataforma, toda a parte de aulas gravadas e aulas ao vivo, ela é totalmente customizada, é muito fácil de você mudar a cara da plataforma, mudar seu logo, sua cor, sua chamada, a ideia que nós temos é a de dar poder para o professor, para qualquer um que queira ensinar alguma coisa, para poder ensinar e fazer uma renda em cima disso”, resume Michel.

O CEO ainda reforça a importância de se manter contato com os usuários para entender demandas e ter ideias de melhorias. “Tiveram muitas ideias que vieram dos próprios professores, dos próprios alunos, coisas que eles estavam sentindo falta na aula virtual e que não tinham em outras plataformas, ou do mundo real que não tinha na plataforma”, exemplificou.

Outro aspecto que é colocado em prática pela 2be Live é o quick fail, onde você consegue testar o protótipo da sua ideia mais rápido. A ideia é fazer o teste com um grupo pequeno e de forma rápida para ver se o negócio funciona. Se funcionar, aumenta o grupo de teste, e se não funcionar, volta para a prancheta, redesenha a ferramenta e testa novamente.

“Acho que essa ideia do quick fail em grupos pequenos é algo que as escolas poderiam começar a testar. Não precisam testar uma nova metodologia na escola inteira, faz em uma sala, ou em uma série, ou em uma das franquias. É uma maneira de você agilizar a transformação”, disse Michel.

Para o CEO da 2be Live, a educação precisa aprender a inovar rápido porque o mercado está mudando, principalmente de forma forçada com a chegada da pandemia, que demandou adaptações muito rápidas para que o processo de aprendizado pudesse continuar. 

“As startups estão aqui para ajudar nesse novo formato, nessa nova época que está começando. Quando acabar a pandemia, nós vamos para um momento de renascença e vão surgir várias novas tecnologias que vai baratear e facilitar muito a educação”, aposta Michel.

 

Para se inspirar

A história da empresa que inspirou a criação do iFood pode parecer, a princípio, um caos Ou seja, algo que não vai dar certo. Mas talvez inspire gestores a entenderem que as adversidades sempre irão existir quando se trata de inovação. Confira:

O irmão de Michel Eberhardt morou nos Estados Unidos enquanto fazia faculdade. Sem saber cozinhar, dependia do serviço de delivery de restaurantes. Ao retornar para o Brasil, em 1996, convidou Michel a empreender e abrir o Disk Cook, uma espécie de iFood em uma época em que ter telefone fixo era caro e a internet ainda era uma realidade muito distante da população brasileira.

Michel conta que a empresa imprimia revistas com o cardápio dos restaurantes parceiros e contava com um call center que centralizava o pedido dos clientes e com os motoboys que faziam as entregas. A operacionalização desse negócio, porém, era insana sem poder contar com a internet

entrega era o dono, o gerente, e esse computador estava trancado no escritório, então não tinha como ele receber esse pedido no meio do dia ou no meio da noite para que fizesse a entrega. Então, no ano de 2002, 2003, linhas de telefone ainda eram uma raridade, eram muito caras e o restaurante possuía uma linha telefônica para receber o pedido da Disk Cook, para poder fazer reserva, para poder passar o cartão de crédito. 

“Era uma dor de cabeça, porque nós fazíamos o atendimento do cliente por telefone, acabava o pedido, já tínhamos que dar uma estimativa de horário de prazo de entrega para o cliente, e não conseguíamos passar o FAX para o restaurante, o tempo ia correndo e acabava atrasando”, contou Michel.

A saída foi encontrar uma forma de se comunicar com os restaurantes sem ser pelo telefone. A inovação veio como o uso de um pagger, onde o restaurante recebia o pedido e aprovava apertando um botão. Do outro lado, a mesma tecnologia também já enviava a informação da entrega para o motoboy. “Com isso, nós conseguimos facilitar bastante a operação e crescer. Tínhamos um site e começamos isso em 2005, 2006, onde víamos que o futuro seria online porque, para nós, o custo era muito mais barato, porque não precisava passar pelo atendimento físico”, explicou.

Com o avanço do celular entre a população, foi possível até começar a usar o serviço de SMS para fazer pedidos no Disk Cook. 

A virada de chave para o negócio foi quando Michel e o irmão entenderam que a Disk Cook deveria se tornar uma “tomadora de pedidos” para conseguir escalonar o alcance. A ideia de se ter um aplicativo para isso tiraria o custo de atendimento e do telefone, facilitando a operação. O cenário no Brasil já era outro, de crescimento do uso da internet e do mobile. Assim, eles entenderam que seria necessário separar as ideias, criando o iFood para abrigar esse serviço. 

Com um fundo de investimento, foi possível tirar a ideia do papel. “Fizemos um acordo em que todos os pedidos online da Disk Cook pelo site precisavam passar pelo iFood”, disse Michel. E, assim, o iFood foi crescendo. Em 2015, Michel decidiu vender sua participação na empresa e foi estudar na Califórnia, onde a história da 2be Live começou.

Assista à palestra completa:

Como a forma de inovar nas startups pode inspirar escolas?