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“Toda criança é um artista”, resume o artista plástico e professor do curso de artes visuais da PUC-Campinas, Paulo Cheida Sans. O ato de desenhar faz parte da infância e é comum que todas as crianças queiram desenhar. 

É por meio dele que a criança se comunica e consegue extravasar os sentimentos, desenvolvendo habilidades O professor lembra que o ato de desenhar faz parte de qualquer época, desde a pré-história, e faz parte do desenvolvimento do ser humano.

“O desenho independe de se ter um papel ou não. Na mesa digital, é a mesma coisa que usar o lápis ou desenhar com a colher na sopa, por exemplo”, explica o especialista. “É normal as crianças de dois anos quererem desenhar e quando elas desenham sem bloqueio dos adultos, desenvolve a inteligência e o raciocínio. Pelo desenho, a criança também consegue extravasar os sentimentos”, diz.

Segundo o especialista, quando a criança não gosta de alguém, ou ela não desenha ou desenha essa pessoa muito pequena. O desenho é um instrumento para expressar as emoções, além de ser ferramenta para desenvolver capacidades e habilidades para a vida dessa criança.

Porque incentivar o desenho na infância?

Cheida Sans é autor dos livros “Pedagogia do Desenho Infantil” e “A Criança e o Artista”. De acordo com o professor, a criança vai descobrindo sozinha a sequência das coisas na hora de desenhar. “No início ela não vai pintar o céu de azul e sim as nuvens”, exemplifica.

Entre 1 e 2 anos, a criança faz os rabiscos, que fazem sentido para ela. Em certo momento aparece o símbolo mais marcante de todos: a mandala. Trata-se de um círculo cruzado. “A partir daí, a criança já está enxergando a realidade das coisas. Nisso ela passa a conseguir desenhar o sol, os olhos e o corpo em palito. Depois essa criança descobre como fazer a barriga e outros detalhes, e aí vai”, contou.

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Segundo Cheia Sans, até perto dos 10 anos a criança não precisa de interferência dos adultos no processo de desenhos. “O desenho ativa a memória. A criança só desenha aquilo que ela vivenciou”, resume. 

O videogame e o computador não ajudam a ativar essa memória do que a criança viveu. Nesse sentido, o desenho na infância é uma fonte de imaginação e criatividade, onde as crianças aperfeiçoam movimentos, desenvolvem a linguagem através do registro e do reconto de suas produções.

“O lúdico não pode morrer. Quando se substitui o desenho por jogos, computador e celular, que não precisa usar a memória, deixa de desenvolver uma parte importante da criança que é o lúdico”, acredita o professor. 

 

O professor Paulo Cheida Sans diz que estimular o desenho na infância não significa fazer com que a criança se torne um artista quando adulto. Mesmo se a criança se tornar um bombeiro, por exemplo, o fato dela ter exercitado o desenho na infância vai ajudá-lo a encarar a situação dos incêndios com mais rapidez e o raciocínio lógico deste profissional estará mais apurado na hora do salvamento.

O adulto deve incentivar o ato do desenho, mas ao mesmo tempo precisa tomar cuidado para não bloquear o processo criativo das crianças. É preciso atenção sobre o que se fala sobre o desenho, já que isso pode ser prejudicial para a criatividade. “Às vezes o pai pode dizer: ‘nossa, que bichinho bonito você fez’, e a criança dizer que aquilo era uma pedra. Isso pode criar um bloqueio, mesmo sem querer. A criança sente muito quando falam algo errado do que ela desenhou”, alerta o professor.

“A relação do bonito e feio não existe na criança. Então quando a criança começa a ter autocrítica e medo de desenhar coisas feias, isso mostra que ela já tem uma influência da sociedade e deixa a criança tolhida”, explica.

O desenho na educação infantil

O desenho infantil merece uma atenção especial durante o desenvolvimento das crianças e também deve ser incentivado nas escolas. No NEI (Núcleo de Educação Integrada) da Fundação Romi, escola de Santa Bárbara d’Oeste (SP), busca-se estimular o desenho em uma prática constante na educação infantil. 

“Através do exercício diário, as crianças revisitam suas produções para que possam observá-las e aprender com elas. Encontram soluções a partir das tentativas feitas e ampliam o universo de possibilidades, ao realizá-las em diversos suportes e materiais. Além disso, desenvolvem os movimentos manuais e ampliam a coordenação motora fina”, explicou a coordenadora pedagógica da educação infantil, Aline Franco Teixeira Luiz.

De acordo com a coordenadora, a prática do desenho no NEI Fundação Romi é intercalada entre o desenho livre, o desenho de imaginação e o desenho de memória, fazendo parte dos contextos investigativos nas propostas de sala e nos momentos livres, como intervalos. 

“Em algumas vezes, elas são complementares ou ponto de partida para as brincadeiras desenvolvidas. Os desenhos de imaginação e memória partem de observações de imagens, que são retiradas para que sejam desenhadas, ou objetos reais, geralmente seguindo o tema de algum projeto desenvolvido com a turma”, exemplificou Aline.

No NEI, o desenho é encarado como forma de expressão, livre e natural da infância. O educador é instruído a fazer as devidas intervenções e a estimular o potencial de criação da criança. A escola ainda orienta os pais a favorecer esse desenvolvimento nos momentos de criação fora do ambiente escolar, oferecendo diversos suportes e materiais, incentivando o processo criativo através da produção das próprias crianças. Há também a orientação para que os pais perguntem as histórias dos desenhos para as crianças, ajudando-as a refletir sobre as próprias produções.  

“Além do trabalho com o lúdico ser importante na educação infantil, é também um exercício em respeito ao desenvolvimento da criança”, resume Aline. “As habilidades são estimuladas de acordo com a faixa etária, levando em consideração a escuta ativa e o centro de interesse na organização de propostas que façam sentido para as crianças. Assim, é possível acompanhar o envolvimento dos pequenos e consequentemente, seu aprendizado”. 

A coordenadora pedagógica chama atenção para o fato de que o NEI Fundação Romi tem recebido famílias cada vez mais conscientes sobre a importância do desenvolvimento das crianças pequenas e que buscam a parceria da escola para favorecer um desenvolvimento que respeite as necessidades das crianças de acordo com a sua faixa etária.

 

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