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Entender as informações oferecidas a partir da coleta de dados de mercado e avaliação de níveis de satisfação, por exemplo, pode revelar respostas aos gestores sobre os rumos que a escola está tomando

Oferecer um produto ou serviço ao mercado e não saber como o consumidor ou cliente reage em relação a ele é um comportamento em desuso em qualquer atividade profissional que preza pela excelência de processos internos e crescimento. A realidade de instituições de ensino acompanha essa máxima: a inteligência de mercado é um caminho sem volta para compreender a percepção que pais e responsáveis, alunos e colabores constroem dia a dia em relação à instituição.

“Quando a gente fala em uma lógica de inteligência de mercado, seja para um colégio ou alguma empresa, a ideia é nos utilizarmos de dados para uma tomada de decisão mais racional e assertiva”, define Miriam Mazo, coordenador dos cursos de graduação em Bacharelado em Marketing e pós-graduação em Big Data e Marketing Intelligence da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Paraná. Isso, ela explica, “sempre considerando o que a gente chama de centralidade do cliente”.

Indicadores de desempenho, estabelecimento de KPIs (Key Performance Indicator), monitoramento de cenários internos e externos, assim como modelos preditivos de comportamento, são ferramentas que permitem ao gestor a antecipação em situações de tomada de decisão, de acordo com Miriam. “Isso representa estar observando o mercado de uma forma inteligente”, resume a especialista.

O conceito foi percebido inicialmente por grandes indústrias, quando atividades ligadas a bens de consumo entenderam a necessidade de estudar melhor o comportamento do consumidor e monitorar a concorrência. Atualmente, o desenvolvimento de departamentos criados especificamente para essa finalidade chega a utilizar aprendizados fornecidos por elementos neurobiológicos para estudar o comportamento do público – consumidores em potencial – em relação à marca para poder avançar em novos desenhos de modelos de tomada de decisão.

 

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Inteligência de mercado na educação

A docente da PUC-PR afirma que o aproveitamento de práticas do varejo para que a inteligência de mercado educacional seja desenvolvida é tida como tabu. Mas, pontua Miriam, “aquelas [instituições] que entenderam o conceito e trouxeram para si esse monitoramento compreenderam o papel do estudante e o papel de cada um envolvido naquele sistema de ensino”. Ela menciona como exemplo de aplicação da inteligência de mercado os Colégios Maristas, que fazem parte do grupo ligado à universidade.

 

“No colégio, o papel de decisor é muito mais centrado nos pais do que no próprio estudante, que é um influenciador do processo. Entender como se comporta cada um desses integrantes e outras variáveis, monitorando a concorrência, faz com que a gente tenha um cenário melhor e decisões mais assertivas em relação aos colégios”, argumenta Miriam. Na graduação, esse papel se inverte: o estudante passa a assumir mais espaços decisórios. A média de notas e o índice de frequência às aulas são indicadores capazes de sugerir previamente à instituição sinais de que o aluno pode desistir do curso, em outro exemplo mencionado pela docente.

Para Maurício Berbel, sócio fundador da Alabama Consultoria Educacional, “é importante que a escola se abra e desenvolva a habilidade de observar o seu entorno”. Ele sugere três tópicos que abordam a finalidade que a inteligência de mercado para escolas pode representar:

  • Dimensionamento de mercado – quantas famílias têm perfil para consumir o serviço da sua escola.
  • Competição – entender quais são os outros players que atuam no mesmo mercado com quem você concorre.
  • Oferta – melhorar a entrega conhecendo as expectativas das famílias e quais são as opções que elas têm.

Mesmo instituições que ainda não tenham desenvolvido um método de coleta de dados interno ou não estejam servidas por uma ferramenta de suporte para gestão podem se valer de informações acessíveis livremente, como a base de dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) para acompanhar a evolução do número de alunos na região onde atua. “Mas também desenvolver métricas para isso”, pontua Maurício, “de conversação, de lides, de alunos novos, de índice de fidelização”. O consultor em Educação argumenta que a escola que se familiariza com dados e indicadores encontra caminhos para nortear a gestão e “perceber onde ele tem que investir mais tempo e mais energia”.

Em novo exemplo da inteligência de mercado na educação citado por ele, uma pesquisa de comportamento de compra com alunos novos é capaz de apresentar uma série de elementos úteis para a campanha de matrícula. Isso ajuda a perceber detalhes que são gerados pela própria família em uma visita à escola, como pontos da estrutura física que precisam ser melhorados. “Quando a gente faz uma pesquisa de satisfação, não estamos medindo apenas o NPS (Net Promoter Score) e tratando aquilo estritamente como um número ou um certificado. A gente procura desdobrar isso em respostas abertas e aspectos qualitativos”, diz o sócio fundador da Alabama.

Indicadores como aliados das escolas

Maurício Berbel compara a missão de “pilotar uma escola” a conduzir um avião de pequeno porte ou um carro moderno: “Você tem de 15 a 20 indicadores que são fundamentais. Conhecendo esses indicadores e seus derivados, você tem como acompanhar sua escola de uma maneira muito mais profissional. Quando a escola começa a entender melhor seu modelo de negócio descrito por números, fica mais fácil de gerenciar a escola e de [o gestor] apontar para a equipe quais pontos precisam ser melhorados mais rapidamente. É importante sentir o organismo, saber onde dói e saber o remédio adequado para aquela dor”.

O componente da inteligência de mercado também modifica a maneira como a educação foi estruturada nas cidades brasileiras. Fabricio de Paula Silva, mestre em Educação e pesquisador junto ao Escolas Exponenciais – líder em pesquisa e apoio estratégico para instituições de ensino -, entende que durante muito tempo a educação, do ponto de vista de mantenedores e diretores, foi feita a partir da intuição e da articulação social de indivíduos. Dessa forma, dois grandes grupos de escolas foram estabelecidos na rede privada na maioria dos municípios:

  • O primeiro grupo é formado por escolas confessionais, ligados a entidades religiosas geralmente presentes e relevantes na vida social da região. 
  • O segundo grupo é formado por escolas criadas por pessoas que um dia começaram como educadores e em determinado momento resolveram abrir uma escola própria, tornando-se empreendedores.

“É por isso que digo que muitas escolas nasceram e cresceram da intuição e das articulações sociais de indivíduos. Por trás dessas instituições, em boa parte de sua história, não existiu uma estratégia sólida de negócio, incluindo marketing, vendas e serviços. Porém, hoje, a educação básica tem atraído cada vez mais empresas e grupos financeiros interessados em investir no setor e a promover práticas competitivas agressivas, o que tem gerado desafios enormes para escolas tradicionais”, observa Fabricio.

 

É por isso que o pesquisador entende que organizar estratégias baseadas na coleta de informações e dados relevantes para a tomada de decisão fazem e farão a diferença no mercado do segmento. Ele ajuda, com novo exemplo, a entender condições criadas a partir de indicadores construídos por uma hipotética instituição de ensino.

“Imagine que uma escola que atua da educação infantil ao ensino médio tem, historicamente, o 1º ano do ensino fundamental como principal porta de entrada na instituição. Ao longo de um período essa escola passa a captar cada vez menos alunos para o 1º ano e, intuitivamente, imagina que está perdendo matrículas para outras pequenas escolas da região. Essa observação pode levar à tomada de decisões de, por exemplo, promover descontos no preço das mensalidades para atrair novos alunos, impactando o caixa da instituição. 

Porém, e se o problema não for a concorrência? Pode ser que a diminuição nas matrículas na série deva-se a uma mudança demográfica, como um número menor de famílias que moram ou trabalham na região e que têm filhos com idade entre 5 e 6 anos. Olhando dados do censo, ou realizando uma pesquisa com empresas da região, a escola pode descobrir, de fato, o que pode estar levando à diminuição no número de matrículas na região. As decisões estratégicas são completamente diferentes em cada um dos diagnósticos.”

Panorama pode ajudar escola a desenvolver inteligência

O Panorama Nacional do Ensino Privado do Escolas Exponenciais é um serviço que oferece acesso a um retrato completo da educação no País e serve como ferramenta para desenvolver uma cultura interna na escola que reconheça o impacto da coleta de dados na rotina de gestão. De acordo com Fabricio de Paula Silva, o EX, além de pesquisas próprias de indicadores de como anda o mercado, também trabalha com dados históricos, especialmente no caso das 50 maiores cidades brasileiras.

“Para cada uma delas é possível ter um panorama geral da rede privada do município, bem como acompanhar indicadores sobre todas as escolas da região. Dessa forma, o Panorama realiza todo o trabalho pesado de coletar, processar e organizar dados, transformando-os em informação, para que o diretor escolar possa analisá-los e transformá-los em conhecimento e em inteligência de mercado”, explica o pesquisador.

O EX também publica artigos com análises, entrevistas e notícias que ajudam a construir o conhecimento de mercado. Os grupos de gestores reúnem diretores, mantenedores e coordenadores que têm a oportunidade de realizar interações com outros profissionais, gerando conhecimento tácito e compartilhando práticas e experiências valiosas para todos. É possível saber mais sobre o Panorama aqui.

Vale lembrar: tudo tem limite, inclusive coletar dados

Desenvolver ferramentas claras de coleta de dados e pesquisa, que posteriormente serão aproveitadas por gestores como inteligência de mercado, é uma ação ressaltada pelo regramento de acesso a informações. “Hoje, em termos de coleta de dados, tudo é possível, mas nem tudo é permitido”, explica novamente Miriam Mazo, coordenadora dos cursos de graduação em Bacharelado em Marketing e pós-graduação em Big Data e Marketing Intelligence da PUC-PR. Ela chama atenção, nesse sentido, para o papel da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), especialmente em relação a dados internos. “Ela veio para normalizar e regularizar esse mercado. Nós temos a obrigação de estar em conformidade com a LGPD”.

 

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