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Um ano depois do início da pandemia, a necessidade de aprimorar ou até mesmo implantar o ensino remoto e híbrido nas escolas do Brasil tem se mostrado um desafio. Além das dificuldades técnicas e de adaptação dos profissionais, existe uma tendência de aumento da disparidade entre os alunos, sobretudo em função das diferentes condições e habilidades.

Estudo recente do Banco Mundial mostrou que mais de dois em cada três estudantes do primeiro ano do ensino médio – ou dos últimos anos do ensino fundamental – não serão capazes de entender um texto de tamanho moderado. Neste contexto de urgência educacional, a personalização do ensino surge como um meio de reduzir danos e potencializar os estudantes que podem ir além mesmo no cenário adverso.

Especialista da Geekie em conteúdos educacionais e mestre em divulgação científica e cultural pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Alex Contin explica que a personalização do ensino é uma estratégia que leva em consideração as principais dificuldades e facilidades de cada estudante. O objetivo é ofertar suporte para preparação de experiências de aprendizagem direcionadas.

Isso ajuda o professor a entender quais são os caminhos possíveis para promover o reforço e não deixar nenhum aluno para trás, bem como impulsionar aqueles que estão com desempenho acima da média da turma. Porém, como é possível aplicar a personalização do ensino na prática?

Contin cita um exemplo hipotético, mas que ilustra bem a dinâmica. Consideremos que 85% dos estudantes que tiram nota seis nas provas, erraram quatro das cinco questões relacionadas a sólidos geométricos.

Segundo o especialista, quando o professor tem esse tipo de informação de maneira mais visível, ele pode supor que os exercícios passados em sala de aula – ou a forma como o aprendizado foi promovida – não foi tão eficiente com aquele grupo específico.

“A partir disso, o docente pode propor outros exercícios. Indicar um vídeo de reforço sobre o tema ou criar um grupo com esses alunos para promover um projeto prático sobre construção de cones, pirâmides e cubos com materiais reciclados para colocar a mão na massa e fazer uma aproximação diferente para ensinar as fórmulas dos cálculos”, citou Conti.

O mesmo raciocínio vale para os alunos que tiveram desempenho máximo nos exercícios e avaliações. A ideia é proporcionar experiências que possam desenvolver habilidades em cada aluno, de acordo com seu desempenho.

“Valeria, então, experiências mais avançadas de aprendizagem para desafiá-los e estimular que aprendam cada vez mais. O professor pode convidar um aluno com notas acima da média para integrar grupos de estudos direcionados a apoiar aqueles que estão com mais dificuldade”, comentou Conti.

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Desafios

A principal vantagem dessa forma de aprendizagem personalizada é engajar os estudantes na construção do próprio conhecimento e no desenvolvimento das habilidades e competências necessárias em cada fase. Apesar do profissional não ver desvantagens, ele pondera que existem desafios, principalmente para os docentes quanto ao processo de ensino. 

“Um ensino mais personalizado requer visibilidade e acompanhamento constante dos estudantes. Neste cenário, as tecnologias digitais são grandes aliadas para otimizar a rotina e obter dados e evidências em tempo real do engajamento e desenvolvimento dos alunos”, explicou Contin. 

Mesmo sendo possível aplicar a personalização sem necessidade de tecnologias, a tendência do virtual ganha espaço no cenário de pandemia. O especialista alerta que é preciso levar em conta a saúde mental tanto dos alunos quanto dos professores. 

“A aprendizagem não ocorre única e exclusivamente no cérebro, ela envolve também a emoção. Logo, entender e ter empatia com esses cenários é um cuidado muito importante para não sobrecarregar a comunidade escolar e conseguir promover um desenvolvimento integral, unindo os processos cognitivos ao desenvolvimento socioemocional”, afirmou Conti. 

Como colocar em prática a personalização do ensino

Atualmente, existem empresas especializadas em oferecer metodologias de educação híbrida para escolas. É o caso do programa “De Criança para Criança”, uma plataforma que permite que os alunos desenvolvam conhecimento sobre temáticas diversas. 

Presidente da empresa, Gilberto Barroso diz que o objetivo é colocar a criança no centro da aprendizagem. A partir de discussões, os alunos constroem coletivamente histórias, fazem desenhos e gravam locuções relativas às narrativas criadas. Posteriormente, o material produzido por eles será transformado em animações feitas pela plataforma.

O modelo é adaptável para diferentes necessidades e disciplinas. Uma aula de História sobre o descobrimento do Brasil, por exemplo, pode se tornar mais interativa. 

Em um formato convencional, os alunos entram na sala de aula, abrem o livro na página indicada pelos professores, fazem exercícios na lousa e depois levam o material para casa. Em outro momento, os estudantes farão uma prova para identificar se o conteúdo foi absorvido. 

A maneira proposta pelo “De Criança para Criança” prevê que o professor questione os alunos sobre o tema, tentando identificar conhecimentos prévios. O educador aparece como um mediador, conduzindo as crianças até as respostas corretas, mas permitindo a troca de ideias. 

“Através de perguntas investigativas, ele [professor] vai estimulando a cabeça das crianças a encontrar esse mesmo conteúdo. Se o professor estiver bem preparado, ele consegue estimular as crianças para que elas construam esse roteiro. Muito mais do que criar uma história, esses alunos estão aprendendo a ouvir o colega, a respeitar as ideias, a impor suas ideias e ponderar sobre as ideias de todos”, disse Barroso. 

Uma vez elaborada a narrativa, o professor vai dividir o “roteiro” com base em imagens produzidas pelas crianças. No final, um vídeo de pouco mais de um minuto será gerado pela plataforma, que pode atender desde a educação infantil até o ensino médio.

As imagens podem ser fotografadas e inseridas na plataforma. Da mesma forma, as crianças podem gravar narrações para a história. “Ela [criança] participou da criação daquilo. Depois de 20 anos, ela não vai precisar estudar para lembrar do que ela fez. Isso já vai estar dentro dela”, comentou Barroso.

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