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Em tempos nos quais os estudantes recebem cada vez mais estímulos, as tecnologias digitais na educação podem ser uma importante aliada para despertar o interesse dos alunos. Um estudante que participa ativamente de seu aprendizado tem um desenvolvimento muito mais significativo. Porém, mostrar para as crianças que o ensino pode ser composto por momentos positivos é, muitas vezes, mais difícil do que parece.

Felizmente, a modernidade também traz novas possibilidades – e, durante a pandemia, percebemos ainda mais o valor da tecnologia como aliada na educação. Com a necessidade de adaptação que veio junto à crise do Covid-19 apareceram, inclusive, os termos “síncrono” e “assíncrono” para descrever modos de ensino. 

Características do ensino síncrono e assíncrono

Ensino síncrono é caracterizado pela interação simultânea, ou seja, em que aluno e professor interagem em um mesmo momento, ao vivo. Podendo ser em um ambiente físico ou digital.

No ensino assíncrono essas trocas acontecem em tempos diferentes, de forma que professor e aluno conseguem acessar um mesmo conteúdo, porém em momentos distintos. O estudo independe da sincronicidade para acontecer.

E, apesar de termos aprendido muito, ainda não entendemos completamente todos esses conceitos, como explica Bruno Alvarez, coordenador pedagógico do ensino médio do colégio Pentágono

“Fundamentalmente, a gente não sabe, ou não entende, qual é o impacto que o assíncrono tem no síncrono”, ele diz. “Então eu fico imaginando que alguns alunos, daqui pra frente, vão começar a questionar as práticas síncronas, a partir do que eles veem nas práticas assíncronas”. Isso pode demandar, segundo Alvarez, uma reforma curricular robusta.

As tecnologia digitais na educação como aliadas do ensino

As discussões a respeito desse tema são, portanto, cruciais e complexas – e Letícia Reina, gestora educacional da plataforma educacional de leitura Árvore, lembra que já devíamos estar dando espaço para elas até antes da pandemia. “Acho que com a pandemia saltou aos olhos como que as tecnologias digitais na educação podem e devem estar a serviço do processo de ensino e aprendizagem”, reflete. “A pandemia só colocou uma luz ali”

Para ela, esses recursos já deveriam estar à disposição das escolas, e agora a hora é de selecionar o melhor de cada modo de ensino – do síncrono e do assíncrono, do presencial e do online – para criar a melhor forma de engajamento possível.

As tecnologias digitais na educação, por exemplo, podem ajudar na formação de um processo inovador como vias de acesso à informação curada. Isso encoraja o protagonismo do aluno na aprendizagem, além de aumentar seu repertório. 

“Eu acho que esse é o grande lance do engajamento”, opina Letícia. “Não adianta o síncrono o dia inteiro, o cara vendo aula, que é o que a gente viu no ensino remoto emergencial (…) e não potencializar e escutar o que esse aluno tem para dizer”.

Desse modo, a tecnologia deve servir a um objetivo maior – a educação. Durante a história, vários aspectos da sociedade têm sido moldados ou transformados pela tecnologia – até porque essa palavra, em si, significa “tudo que modifica o ambiente onde vivemos”, como aponta Marcelo Milani, coordenador da área de tecnologias educacionais do colégio Humboldt

Assim, é essencial pensar no contexto em que as nossas tecnologias digitais na educação, hoje, se inserem. Tecnologia por tecnologia não vai engajar o aluno, isso ele tem na casa dele, não é?, indaga Milani. “Mas a maneira como for trabalhar isso, a maneira como você vai conseguir sincronizar aquelas práticas, que são clássicas, com as práticas que são mais modernas ou mais inovadoras, essa que é a grande questão”, completa.

Ambientes diferentes

Algumas das mudanças trazidas pela quarentena apresentam possibilidades: só porque voltamos ao ensino presencial, por exemplo, não significa necessariamente que os alunos precisam estar fisicamente dentro de uma sala de aula durante o aprendizado. Milani diz que, para algumas atividades, pode ser benéfico permitir que os alunos as realizem em lugares diferentes, como um jardim. “Se essa era a parte legal de todo o processo, por que é que a gente vai perder e fazer com que tudo isso volte para aquele momento onde ele era obrigado a ficar dentro de uma sala de aula?”, explica. “A gente já provou que isso não é necessário”.

Uma sala maker também é um ambiente novo e animador: a cultura maker, que incentiva a filosofia do “colocar a mão na massa”, pode ser uma grande aliada da educação. Milani, inclusive, recorda que a sala maker do Colégio Humboldt fez muito sucesso com os alunos, e permitiu que eles aprendessem de forma mais divertida e autônoma; afinal, aprender um conteúdo da forma tradicional pode às vezes não prender o interesse do aluno, e quando esse aprendizado acontece com um projeto ou desafio – como construir coisas – o engajamento é muito maior. 

Além disso, essas atividades incentivam que os alunos trabalhem e ajudem uns aos outros – o que, em certos momentos, pode contribuir para uma absorção de conteúdo melhor do que o ensino tradicional. A utilização da cultura maker na educação prova que nem sempre a tecnologia utilizada para inovar precisa, necessariamente, ser expressada por tablets ou aparelhos digitais.

O verdadeiro ensino híbrido

No Colégio Pentágono, os educadores inovaram ao criar trilhas digitais para ajudar os alunos: com esses recursos, os estudantes conseguem encontrar mais facilmente informações de qualidade para serem incorporadas em suas redações. “Isso, certamente, não só melhorou a qualidade das redações, mas também, de certa forma, gerou mais interesse no aluno porque ele soube, talvez pela primeira vez, como buscar”, diz Bruno Alvarez. 

Similarmente, a plataforma Árvore oferece os recursos “Árvore Livros” e “Árvore Atualidades”, também focados em pesquisa curada de conteúdo. Isso também é um exemplo das tecnologias digitais na educação sendo utilizadas para o protagonismo estudantil que não se limita ao momento passivo de transmissão de conhecimento, como diz Letícia. 

Um ponto importante, lembra Marcelo Milani, é deixarmos de lado a ideia de “ensino híbrido para o ensino na pandemia” – isso porque o que observamos naquela época não foi realmente ensino híbrido, e sim um regime remoto emergencial em consequência das mudanças drásticas no dia a dia. As práticas híbridas reais envolvem a mistura do síncrono e assíncrono – presencial e virtual – e a possibilidade de ter vários alunos fazendo coisas diferentes ao mesmo tempo; afinal, cada indivíduo trabalha do seu jeito e chega a resultados em seus próprios momentos. 

Mapeando o aprendizado com tecnologias digitais na educação

O coordenador também defende o aproveitamento do modelo digital para o acompanhamento do progresso dos alunos. As tecnologias digitais na educação, com esse tipo de mapeamento, permitem que o professor tenha noção dos conteúdos que estão sendo melhor trabalhados pela classe, economizando tempo e melhorando o engajamento. “Não tem uma forma melhor de você engajar um aluno que você não fazer ele perder tempo com aquilo que ele não tem interesse porque ele já sabe”, diz. “Você desafia ele de uma forma nova”. 

Outra forma de mapeamento, dessa vez utilizada pelo Colégio Pentágono, é a correção por rúbricas: a correção dos textos dos alunos com essa ferramenta, explica Alvarez, permitiu que os educadores reconhecessem onde estavam as fraquezas e fortalezas dos alunos. Era possível realizar isso de forma manual, é claro, mas seria muito mais difícil e demorado, desencorajando os profissionais. 

A partir do momento em que a gente usou a tecnologia, vimos que isso é possível e, quando a gente deu a devolutiva para os alunos, eles se sentiram muito mais animados em participar das edições seguintes”, conta. “Isso é engajamento”.

Protagonismo estudantil

Segundo Alvarez, a autonomia é parte importante das metodologias adaptadas à nova realidade. Portanto, metodologias que “passem o foco do professor para o aluno” são os objetivos dos educadores hoje em dia. E isso, é claro, tem tudo a ver com protagonismo estudantil – ou seja, colocar o aluno no centro do processo de aprendizagem, permitindo que ele tenha papel ativo em vez de passivo em sua educação.

 “A partir do momento em que você tem soluções digitais inteligentes, que nos ajudam a dar autonomia para o aluno, você está construindo protagonismo”, diz Alvarez. “Ele se sente valorizado nesse sentido e passa a ver mais sentido em tudo aquilo que ele está fazendo na própria sala de aula mesmo em momentos expositivos”.

Letícia explica que um dos elementos do protagonismo estudantil, pela parte do professor, envolve o acionamento dos conhecimentos prévios dos alunos como estratégia didática”; ou seja, considerar a história do aluno até aqui e o que pode ser familiar sobre um tema ou tarefa torna o ensino muito mais rico. “Quanto mais se acionam esses conhecimentos prévios, mais links serão possíveis de serem feitos e mais significativa essa aprendizagem se torna”, diz.

O ato da escuta, em geral, é fundamental para o engajamento, especialmente pensando no protagonismo do aluno. Portanto, estar a par do universo dos alunos – que muitas vezes parece tão diferente e novo – é essencial para conseguir trazer essas referências para a sala de aula, criando uma maior conexão com os estudantes. 

Usar tecnologias e linguagens diferentes pode ter um impacto muito grande no aprendizado; conteúdo feito no Tik Tok, febre entre os jovens, é uma forma atual e atrativa de absorver conteúdo. “É uma linguagem multissemiótica, é a maneira que se comunica”, pontua Letícia. “Então eu acho que leva em consideração não só o que eles sabem, mas como eles acessam o conteúdo, para que, de fato, tenha engajamento e, de fato, a gente escute e eles atuem com protagonismo nos conteúdos aprendidos”.

É claro que esse protagonismo, como responsabilidade, vem acompanhado de erros e acertos – e tudo bem. Erros são partes importantes do aprendizado, e nem todo aluno capta informação do mesmo jeito. Da mesma forma, metodologias ativas, como a cultura maker, podem apresentar ao aluno novos jeitos de fazer as coisas, que nem sempre correspondem aos modos com que estamos acostumados – isso não significa que não sejam válidos. 

“A gente quer que o aluno assuma o protagonismo, mas quando ele assume, o que fazemos com isso?” reflete Marcelo Milani. “A gente diz para ele que está errado e ignora o fato de que o erro faz parte do processo científico?”. É essencial prestar atenção e não permitir que o conforto da tradição impeça o progresso. Testar diferentes linguagens de aprendizado para cada aluno, lembra Letícia, também é investir no protagonismo.

O cuidado necessário para inovar

Apesar do entusiasmo que vem com as diferentes tecnologias digitais na educação e suas possibilidades, é preciso, além de simplesmente adquirir esses recursos, preparar tanto os educadores quanto os alunos para usarem essas novidades da melhor forma possível. 

Um projeto pedagógico sólido e baseado em evidências, diz Bruno, é essencial para reconhecer e escolher o que dá certo ou não. A tecnologia tem uma natureza efêmera, e nem tudo que é testado permanece para sempre. Por isso, toda escola precisa de um trabalho gradual e bem feito para descobrir o que usar e como usar.

Por algum tempo, muitas pessoas pensaram, por exemplo, que os tablets iriam revolucionar a educação, como lembra Marcelo Milani. Mas não adianta apenas comprar e fornecer aparelhos desse tipo para professores e alunos sem ajudar na adaptação. Precisamos questionar se o professor está empoderado para utilizar essas tecnologias – afinal, sem apoio, o profissional se tornará inseguro (e essa insegurança, então, vai ser transferida para os alunos). “Porque você, enquanto coordenador, enquanto gestor, talvez não tenha, também, se dedicado a ajudar esse professor a transpor esse abismo que parecia intransponível, e isso vira sofrimento”, aponta Milani. 

Daqui para a frente

O segredo, quando se fala desse assunto, talvez seja aprender a transformar experiências em usos didáticos. Afinal, como diz Letícia, muito se fala da conexão dos jovens com a tecnologia, mas nós adultos também estamos mergulhados neste mundo e somos atraídos por ele hoje em dia. Por que não, portanto, tornar isso uma situação didática? “Por que não usar a mediação do professor para essa força, para que ele use as redes sociais de maneira, de fato crítica?”, questiona.

Milania ainda avisa que, como tudo na vida, nem toda aula tem que ser “divertida” o tempo todo. Ainda assim, a incorporação de técnicas de engajamento são necessárias não apenas para melhorar o rendimento dos alunos, mas também para fazer da escola um ambiente agradável. E o uso das tecnologias digitais na educação, para tudo isso – apesar delas terem ganhado mais espaço nos últimos anos – não começou e nem acabará na pandemia, mas precisa ser trabalhado cuidadosamente.

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