Cada vez mais procurada pelos pais por conta da correria do dia a dia, o ensino integral na educação infantil tem ganhado espaço no meio educacional. Mas se engana quem pensa que essa modalidade significa simplesmente que o aluno passe mais tempo na escola, principalmente dentro de uma mesma sala de aula. A educação integral vai muito além disso.
Nela, a criança convive com múltiplas oportunidades de aprendizagem, seguindo um programa político-pedagógico. Ou seja, estará em contato com atividades culturais, de arte, esporte, ciência e tecnologia, tanto na teoria quanto na prática.
O que é ensino integral
De acordo com o Centro de Referências em Educação Integral (CREI), “a Educação Integral é uma concepção que compreende que a educação deve garantir o desenvolvimento dos sujeitos em todas as suas dimensões – intelectual, física, emocional, social e cultural – e se constituir como projeto coletivo, compartilhado por crianças, jovens, famílias, educadores, gestores e comunidades locais”.
Com a ajuda das professoras Gabriela Tebet, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Rita Khater, da Faculdade de Psicologia da PUC-Campinas, reunimos dicas, esclarecemos dúvidas e mostramos como diretores e gestores podem implantar o ensino integral na educação infantil.
Conceito da educação infantil
Em primeiro lugar, afirma Gabriela, é importante reavaliarmos o conceito “ensino” na educação infantil, uma vez que esse termo implica uma concepção transmissiva do conhecimento tendo a professora como elemento central do processo. “Essa convicção contraria as concepções de criança e de currículo presentes tanto nas DCN/EI [Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil] como na BNCC [Base Nacional Comum Curricular]”.
Estes documentos indicam que o currículo da Educação Infantil é “um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade”.
Segundo Gabriela, as propostas pedagógicas da Educação Infantil devem considerar que a criança – centro do planejamento curricular – é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva. “Brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura”, afirma a professora.
Programa de ensino integral na educação infantil
No caso da Educação Infantil em período integral é importante avaliar muito bem qual o melhor modo de compor as turmas, quais projetos serão desenvolvidos no período da manhã e no da tarde e como eles dialogarão entre si, alerta a professora doutora da Unicamp.
“As crianças atendidas de tarde estarão com as mesmas crianças do período da manhã ou outros arranjos serão realizados? Qual a quantidade e quais as idades das crianças que ficarão em período integral? Tendo esses dados em mente, é possível avaliar qual quantidade de profissionais será necessária e que espaços serão utilizados como salas de referência das turmas atendidas”, explica Gabriela.
Professora, psicóloga e pedagoga docente da Faculdade de Psicologia da PUC-Campinas, Rita Khater afirma que a escola deve priorizar conteúdos e conceitos pedagógicos em um período e no contraturno, oferecer atividades essencialmente lúdicas.
“Muita contação de histórias, teatro, pintura e brincadeira no parque para que a criança não se sinta como uma extensão da sala de aula”, pontua, acrescentando que a sala de aula deve ficar como referência em meio período.
Infraestrutura adequada
No que se refere a adaptações físicas, Rita diz que a escola deve considerar se tem um bom espaço para desenvolver atividades lúdicas, para fazer com que a criança não esteja na mesma sala de aula nos dois períodos. “A sala de aula deve se referir mais a um contexto de aquisições pedagógicas e deixar a outra parte para atividades lúdicas”, destaca.
Gabriela também chama atenção para a necessidade de algumas crianças, em período integral, dormirem, tomarem banho e realizarem refeições extras – além das já oferecidas. “A instituição precisa prever espaços adequados para essas atividades e/ou planejar bem o uso dessas áreas para todas as turmas da unidade”.
Habilidades extras
A fim de garantir maior variedade de atividades possíveis no contraturno, ambas as professoras recomendam a contratação de profissionais com habilidades e experiências artísticas variadas.
“Um docente que toca um instrumento musical, um com experiência em teatro e outro em artes plásticas ou ainda alguém que faça capoeira, dança ou circo”, cita Gabriela como exemplos. Para a definição de quantos profissionais devem ser contratados ou espaços necessários, ela recomenda se espelhar nos parâmetros de qualidade da Educação Infantil do Ministério da Educação (MEC).
Rita afirma que a Educação Infantil exige bastante do profissional. “Ainda que esse seja uma referência da criança, ele tem que ter períodos de descanso, ter períodos para formação, preparação de atividades e de conteúdos, ter períodos longe um pouco dessas salas, para que a criança também tenha uma variedade de contato humano, de formação de vínculos outros que não estreitos a um único profissional”, explica.
De acordo com a pedagoga, a contratação de profissional para uma escola de ensino integral deve ser direcionada para pessoas com habilidades para o lúdico e conhecimento para propor exercícios físicos para o desenvolvimento motor da criança, brincadeiras, teatros e outros.
Integrar é educar
Para a psicóloga e pedagoga da PUC-Campinas, a criança que fica em período integral tem oportunidades maiores de se desenvolver.
“Ela adquire mais autonomia, tem propostas mais efetivas para sua faixa etária. A criança, a despeito de ficar em casa, ainda que com a atenção da mãe, não tem a presença dos amigos, elementos importantíssimos para o desenvolvimento da socialização dela. Uma escola de ensino integral desde a educação infantil contribui muito para o desenvolvimento”, afirma.
Rita diz que a realidade, hoje, é diferente. Muitas mães precisam trabalhar para que tenham condições de criar os filhos. Então, a escola tem que fazer esse papel.
“Não da maternidade, porque esse é insubstituível, mas o papel de propor um desenvolvimento para as crianças, de propor oportunidades para que elas cresçam em demais áreas e não só no contexto estreito e pedagógico do currículo. No contraturno, as crianças têm mais chances de ter uma formação e um desenvolvimento mais amplo”.
Ensino integral na educação infantil é investimento
Rita pontua que a criança não é um miniadulto, que ela difere muito da criança do ensino fundamental, então precisa de um conteúdo extremamente lúdico.
“E lembrar que essa faixa etária é de ouro, uma oportunidade, uma grande janela do desenvolvimento, onde tudo que se propõe tem respostas excelentes e o que não se propõe também tem perdas significativas para a idade adulta”.
Para a pedagoga, investir na educação infantil traz respostas excelentes e a criança, no ensino integral, tem mais oportunidades do que só no meio período. Porém, afirma, desde que a escola seja especializada para isso, que tenha ofertas com esse objetivo.
Dica de leitura:
Para se aprofundar mais sobre esse assunto, confira esse artigo sobre a importância da atividade com música na educação infantil.